terça-feira, 14 de abril de 2015

Livre arbítrio e Responsabilidade



O livre-arbítrio é [...] a faculdade que tem o indivíduo de determinar a sua própria conduta, ou, em outras palavras, a possibilidade que ele tem de, entre duas ou mais razões suficientes de que querer ou de agir, escolher uma delas e fazer que prevaleça sobre as outras.4
          O livre-arbítrio é a condição básica para que a pessoa programe a sua vida e construa o seu futuro, entendendo, porém, que os direitos, limitações e capacidades individuais devem ser respeitados pelas regras da vida em sociedade. A pessoa percebe, instintivamente, os limites da sua liberdade, uma vez que, intrinsecamente livre, criado por Deus para ser feliz, o homem traz na própria consciência a compreensão desses limites.
          O direito natural de liberdade está atrelado ao de responsabilidade, ou seja, quanto mais livre é o indivíduo, mais responsável ele é. A responsabilidade produz o amadurecimento do Espírito ao longo das experiências vividas nos planos material e espiritual. As noções de responsabilidade são observadas, inicialmente, no cumprimento dos deveres sociais e morais para consigo mesmo e para com o próximo em geral. À medida que aprende a associar as noções de liberdade e de responsabilidade, a pessoa melhor exercita o seu livre-arbítrio, sendo impulsionada por um sentimento superior, que lhe permite desenvolver ações de amor ao próximo.
          O ser humano responsável sabe, na verdade, dosar os próprios limites, entendendo que a sua liberdade termina onde começa a do próximo. O homem tem livre-arbítrio de seus atos porque tem a liberdade de pensar e de obrar. Sem o livre-arbítrio, o homem seria uma máquina1, não teria responsabilidade pelo mal que praticasse, nem mérito pelo bem que fizesse. O livre-arbítrio que considera a lei de liberdade e o senso de responsabilidade, habilita o Espírito a agir equilibradamente nas diferentes situações do cotidiano.
          Deus nos deu a liberdade e o livre-arbítrio como instrumentos de felicidade. A liberdade nos é concedida para que possamos ter uma visão mais lúcida de nós mesmos e das demais pessoas, de forma a discernir que papel devemos exercer na sociedade, quais são os nossos limites e possibilidades, assim como os dos semelhantes.
          Devemos considerar que há [...] liberdade de agir, desde que haja vontade de fazê-lo. Nas primeiras fases da vida, quase nula é a liberdade, que se desenvolve e muda de objeto com o desenvolvimento das faculdades. Estando seus pensamentos em concordância com o que a sua idade reclama, a criança aplica o seu livre-arbítrio àquilo que lhe é necessário.2 A criança, sendo menos livre em razão de suas limitações naturais é, conseqüentemente, menos responsável pelos próprios atos. O adulto é considerado responsável pelos seus atos e suas atitudes porque suas faculdades orgânicas e psíquicas estão desenvolvidas, devendo, desta forma, assumir as conseqüências das ações praticadas.
          Não podemos deixar de considerar, entretanto, que o processo de amadurecimento espiritual é gradual, estando diretamente subordinado à lei do esforço próprio. As nossas imperfeições espirituais refletem o nosso estado evolutivo.
          Nesse sentido, os Orientadores Espirituais nos esclarecem que as [...] predisposições instintivas são as do Espírito antes de encarnar. Conforme seja este mais ou menos adiantado, elas podem arrastá-lo à prática de atos repreensíveis, no que será secundado pelos Espíritos que simpatizam com essas disposições. Não há, porém, arrastamento irresistível, uma vez que se tenha a vontade de resistir [...].3
          O Espírito que, de algum modo, já armazenou certos valores educativos, é convocado para esse ou aquele trabalho de responsabilidade junto de outros seres em provação rude, ou em busca de conhecimentos para a aquisição da liberdade. Esse trabalho deve ser levado a efeito na linha reta do bem, de modo que [...] seja o bom cooperador de seu Pai Supremo, que é Deus. O administrador de uma instituição, o chefe de uma oficina, o escritor de um livro, o mestre de uma escola, têm a sua parcela de independência para colaborar na obra divina, e devem retribuir a confiança espiritual que lhes foi deferida. Os que se educam e conquistam direitos naturais, inerentes à personalidade, deixam de obedecer, de modo absoluto, no determinismo da evolução, porquanto estarão aptos a cooperar no serviço das ordenações, podendo criar as circunstâncias para a marcha ascensional de seus subordinados ou irmãos em humanidade, no mecanismo de responsabilidade da consciência esclarecida.6
          Em suma, pode dizer-se que a [...] liberdade e a responsabilidade são correlativas no ser e aumentam com sua elevação; é a responsabilidade do homem que faz sua dignidade e moralidade. Sem ela, não seria ele mais do que um autômato, um joguete das forças ambientes: a noção de moralidade é inseparável da de liberdade.
          A responsabilidade é estabelecida pelo testemunho da consciência, que nos aprova ou censura segundo a natureza de nossos atos. [...] Se a liberdade humana é restrita, está pelo menos em via de perfeito desenvolvimento, porque o progresso não é outra coisa mais do que a extensão do livre-arbítrio no indivíduo e na coletividade. [...]
          O livre-arbítrio é, pois, a expansão da personalidade e da consciência. Para sermos livres é necessário querer sê-lo e fazer esforço para vir a sê-lo, libertando-nos da escravidão da ignorância e das paixões baixas, substituindo o império das sensações e dos instintos pelo da razão.5

1. KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 84. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2003. Questão 843, p. 387.
2. ______. Questão 844, p. 388.
3. ______. Questão 845, p. 388.
4. CALLIGARIS, Rodolfo. As leis morais. 11. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004, p. 151.
5. DENIS, Léon. O Problema do ser, do destino e da dor. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2003. (O Livre-arbítrio), cap. 22, p. 342-343.

6. XAVIER, Francisco Cândido. O consolador. 22. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2000. Questão, 134, p. 85-86.

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