O
livre-arbítrio é [...] a faculdade que tem
o indivíduo de determinar a sua própria conduta, ou, em outras palavras, a
possibilidade que ele tem de, entre duas ou mais razões suficientes de que
querer ou de agir, escolher uma delas e fazer que prevaleça sobre as outras.4
O livre-arbítrio é a condição básica
para que a pessoa programe a sua vida e construa o seu futuro, entendendo,
porém, que os direitos, limitações e capacidades individuais devem ser respeitados
pelas regras da vida em sociedade. A pessoa percebe, instintivamente, os
limites da sua liberdade, uma vez que, intrinsecamente livre, criado por Deus
para ser feliz, o homem traz na própria consciência a compreensão desses
limites.
O direito natural de liberdade está
atrelado ao de responsabilidade, ou seja, quanto mais livre é o indivíduo, mais
responsável ele é. A responsabilidade produz o amadurecimento do Espírito ao longo
das experiências vividas nos planos material e espiritual. As noções de
responsabilidade são observadas, inicialmente, no cumprimento dos deveres
sociais e morais para consigo mesmo e para com o próximo em geral. À medida que
aprende a associar as noções de liberdade e de responsabilidade, a pessoa
melhor exercita o seu livre-arbítrio, sendo impulsionada por um sentimento
superior, que lhe permite desenvolver ações de amor ao próximo.
O ser humano responsável sabe, na
verdade, dosar os próprios limites, entendendo que a sua liberdade termina onde
começa a do próximo. O homem tem livre-arbítrio de seus atos porque tem a
liberdade de pensar e de obrar. Sem o livre-arbítrio, o homem seria uma máquina1, não teria responsabilidade pelo mal que
praticasse, nem mérito pelo bem que fizesse. O livre-arbítrio que considera a
lei de liberdade e o senso de responsabilidade, habilita o Espírito a agir
equilibradamente nas diferentes situações do cotidiano.
Deus nos deu a liberdade e o
livre-arbítrio como instrumentos de felicidade. A liberdade nos é concedida
para que possamos ter uma visão mais lúcida de nós mesmos e das demais pessoas,
de forma a discernir que papel devemos exercer na sociedade, quais são os
nossos limites e possibilidades, assim como os dos semelhantes.
Devemos considerar que há [...] liberdade de agir, desde que haja vontade de fazê-lo. Nas
primeiras fases da vida, quase nula é a liberdade, que se desenvolve e muda de
objeto com o desenvolvimento das faculdades. Estando seus pensamentos em
concordância com o que a sua idade reclama, a criança aplica o seu
livre-arbítrio àquilo que lhe é necessário.2 A
criança, sendo menos livre em razão de suas limitações naturais é,
conseqüentemente, menos responsável pelos próprios atos. O adulto é considerado
responsável pelos seus atos e suas atitudes porque suas faculdades orgânicas e
psíquicas estão desenvolvidas, devendo, desta forma, assumir as conseqüências
das ações praticadas.
Não podemos deixar de considerar,
entretanto, que o processo de amadurecimento espiritual é gradual, estando
diretamente subordinado à lei do esforço próprio. As nossas imperfeições
espirituais refletem o nosso estado evolutivo.
Nesse sentido, os Orientadores
Espirituais nos esclarecem que as [...] predisposições
instintivas são as do Espírito antes de encarnar. Conforme seja este mais ou
menos adiantado, elas podem arrastá-lo à prática de atos repreensíveis, no que
será secundado pelos Espíritos que simpatizam com essas disposições. Não há,
porém, arrastamento irresistível, uma vez que se tenha a vontade de resistir [...].3
O Espírito que,
de algum modo, já armazenou certos valores educativos, é convocado para esse ou
aquele trabalho de responsabilidade junto de outros seres em provação rude, ou
em busca de conhecimentos para a aquisição da liberdade. Esse trabalho deve ser
levado a efeito na linha reta do bem, de modo que [...] seja o bom cooperador de seu Pai Supremo,
que é Deus. O administrador de uma instituição, o chefe de uma oficina, o
escritor de um livro, o mestre de uma escola, têm a sua parcela de
independência para colaborar na obra divina, e devem retribuir a confiança espiritual
que lhes foi deferida. Os que se educam e conquistam direitos naturais, inerentes
à personalidade, deixam de obedecer, de modo absoluto, no determinismo da
evolução, porquanto estarão aptos a cooperar no serviço das ordenações, podendo
criar as circunstâncias para a marcha ascensional de seus subordinados ou
irmãos em humanidade, no mecanismo de responsabilidade da consciência
esclarecida.6
Em suma, pode dizer-se que a [...] liberdade e a responsabilidade são correlativas no ser e
aumentam com sua elevação; é a responsabilidade do homem que faz sua dignidade
e moralidade. Sem ela, não seria ele mais do que um autômato, um joguete das
forças ambientes: a noção de moralidade é inseparável da de liberdade.
A responsabilidade
é estabelecida pelo testemunho da consciência, que nos aprova ou censura
segundo a natureza de nossos atos. [...]
Se a liberdade humana é restrita, está pelo
menos em via de perfeito desenvolvimento, porque o progresso não é outra coisa
mais do que a extensão do livre-arbítrio no indivíduo e na coletividade. [...]
O livre-arbítrio
é, pois, a expansão da personalidade e da consciência. Para sermos livres é
necessário querer sê-lo e fazer esforço para vir a sê-lo, libertando-nos da
escravidão da ignorância e das paixões baixas, substituindo o império das
sensações e dos instintos pelo da razão.5
1. KARDEC, Allan.
O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 84. ed. Rio
de Janeiro: FEB, 2003. Questão 843, p. 387.
2. ______.
Questão 844, p. 388.
3. ______.
Questão 845, p. 388.
4. CALLIGARIS,
Rodolfo. As leis morais. 11. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004, p.
151.
5. DENIS, Léon. O
Problema do ser, do destino e da dor. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2003. (O
Livre-arbítrio), cap. 22, p. 342-343.
6. XAVIER,
Francisco Cândido. O consolador.
22. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2000. Questão, 134, p. 85-86.
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