NECESSIDADE DO TRABALHO
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
O Evangelho Segundo o Espiritismo
Capítulo XVI – ITEM 8
Desigualdade das riquezas
8.
A desigualdade das riquezas é um dos problemas que inutilmente se procurará resolver, desde que se
considere apenas a vida atual. A primeira questão que se apresenta é esta: Por que não são igualmente
ricos todos os homens? Não o são por uma razão muito simples: por não serem igualmente
inteligentes, ativos e laboriosos para adquirir, nem sóbrios e previdentes para conservar. E, alias,
ponto matematicamente demonstrado que a riqueza, repartida com igualdade, a cada um daria uma
parcela mínima e insuficiente; que, supondo efetuada essa repartição, o equilíbrio em pouco tempo
estaria desfeito, pela diversidade dos caracteres e das aptidões; que, supondo-a possível e durável,
tendo cada um somente com que viver, o resultado seria o aniquilamento de todos os grandes trabalhos
que concorrem para o progresso e para o bem-estar da Humanidade; que, admitido desse ela a cada um
o necessário, já não haveria o aguilhão que impele os homens às grandes descobertas e aos
empreendimentos úteis.
Se Deus a concentra em certos pontos, é para que daí se expanda em
quantidade suficiente, de acordo com as necessidades. Admitido isso, pergunta-se por que Deus a concede a pessoas incapazes de fazê-la frutificar para o
bem de todos. Ainda aí está uma prova da sabedoria e da bondade de Deus. Dando-lhe o livre-arbítrio,
quis ele que o homem chegasse, por experiência própria, a distinguir o bem do mal e que a prática do
primeiro resultasse de seus esforços e da sua vontade. Não deve o homem ser conduzido fatalmente ao
bem, nem ao mal, sem o que não mais fora senão instrumento passivo e irresponsável como os
animais.
A riqueza é um meio de o experimentar moralmente. Mas, como, ao mesmo tempo, é
poderoso meio de ação para o progresso, não quer Deus que ela permaneça longo tempo improdutiva,
pelo que incessantemente a desloca. Cada um tem de possuí-la, para se exercitar em utilizá-la e
demonstrar que uso sabe fazer dela. Sendo, no entanto, materialmente impossível que todos a possuam
ao mesmo tempo, e acontecendo, além disso, que, se todos a possuíssem, ninguém trabalharia, com o
que o melhoramento do planeta ficaria comprometido, cada um a possui por sua vez. Assim, um que
não na tem hoje, já a teve ou terá noutra existência; outro, que agora a tem, talvez não na tenha
amanhã. Há ricos e pobres, porque sendo Deus justo, como é, a cada um prescreve trabalhar a seu
turno.
A pobreza é, para os que a sofrem, a prova da paciência e da resignação; a riqueza é, para os
outros, a prova da caridade e da abnegação.
Deploram-se, com razão, o péssimo uso que alguns fazem das suas riquezas, as ignóbeis paixões que a
cobiça provoca, e pergunta-se: Deus será justo, dando-as a tais criaturas? E exato que, se o homem só
tivesse uma única existência, nada justificaria semelhante repartição dos bens da Terra; se, entretanto,
não tivermos em vista apenas a vida atual e, ao contrário, considerarmos o conjunto das existências,
veremos que tudo se equilibra com justiça. Carece, pois, o pobre de motivo assim para acusar a
Providência, como para invejar os ricos e estes para se glorificarem do que possuem. Se abusam, não
será com decretos ou leis suntuárias que se remediará o mal. As leis podem, de momento, mudar o
exterior, mas não logram mudar o coração; daí vem serem elas de duração efêmera e quase sempre
seguidas de uma reação mais desenfreada. A origem do mal reside no egoísmo e no orgulho: os abusos
de toda espécie cessarão quando os homens se regerem pela lei da caridade.
O LIVRO DOS ESPÍRITOS
Parte Terceira – Capítulo 3
Lei do trabalho
Necessidade do trabalho – Limite do trabalho. Repouso. Necessidade do trabalho
674 A necessidade do trabalho é uma lei da natureza?
– O trabalho é uma lei natural, por isso mesmo é uma necessidade, e a civilização obriga o homem a
trabalhar mais, porque aumenta suas necessidades e prazeres.
675 Devem-se entender por trabalho somente as ocupações materiais?
– Não; o Espírito também trabalha, assim como o corpo. Toda ocupação útil é trabalho.
676 Por que o trabalho é imposto ao homem?
– É uma conseqüência de sua natureza corporal. É uma expiação e ao mesmo tempo um meio de
aperfeiçoar sua inteligência. Sem o trabalho, o homem permaneceria na infância da inteligência; por
isso deve seu sustento, segurança e bem-estar apenas ao seu trabalho e à sua atividade. Àquele que tem
o corpo muito fraco, Deus deu a inteligência como compensação; mas é sempre um trabalho.
677 Por que a própria natureza provê, por si mesma, a todas as necessidades dos animais?
– Tudo trabalha na natureza; os animais trabalham como vós, mas seu trabalho, como sua inteligência,
é limitado ao cuidado de sua conservação. Eis por que entre eles o trabalho não gera o progresso,
enquanto entre os homens há um duplo objetivo: a conservação do corpo e o desenvolvimento do
pensamento, que é também uma necessidade que o eleva acima de si mesmo. Quando digo que o
trabalho dos animais é limitado ao cuidado de sua conservação, refiro-me ao objetivo a que se
propõem a trabalhar; mas, inconscientemente, ao prover suas necessidades materiais, se constituem em
agentes dos desígnios do Criador, e seu trabalho não concorre menos para o objetivo final da natureza,
se bem que muitas vezes não percebeis o resultado de imediato.
685 O homem tem direito ao repouso na velhice?
– Sim. Ao trabalho está obrigado apenas conforme suas forças.
685 a Mas que recurso tem o idoso necessitado de trabalhar para viver, se já não pode?
– O forte deve trabalhar pelo fraco e, na falta da família, a sociedade deve tomar o seu lugar: é a lei da
caridade.
☼ Não basta dizer ao homem que é seu dever trabalhar, é preciso ainda que aquele que tem de prover
a existência com seu trabalho encontre com que se ocupar, o que nem sempre acontece. Quando a
falta do trabalho se generaliza, toma proporções de um flagelo como a miséria. A ciência econômica
procura o remédio no equilíbrio entre a produção e o consumo; mas esse equilíbrio, supondo-se que
seja possível, não será contínuo, e nesses intervalos o trabalhador precisa viver.
Há um elemento que
não se costuma considerar, sem o qual a ciência econômica torna-se apenas uma teoria: é a educação.
Não a educação intelectual, mas a educação moral; não ainda a educação moral pelos livros, mas a
que consiste na arte de formar o caráter, que dá os hábitos: porque educação é o conjunto dos hábitos
adquiridos.
Quando se pensa na massa de indivíduos lançados a cada dia na torrente da população,
sem princípios nem freios e entregues aos próprios instintos, devem causar espanto as conseqüências
desastrosas que resultam disso?
Quando essa arte for conhecida e praticada, o homem trará hábitos
de ordem e de previdência para si e para os seus, de respeito pelo que é respeitável, hábitos que lhe
permitirão atravessar menos angustiado os maus dias inevitáveis.
A desordem e a imprevidência são
duas chagas que uma educação bem conduzida pode curar; aí está o ponto de partida, o elemento real
do bem-estar, a garantia da segurança de todos.
ÓBRAS PÓSTUMAS
O egoísmo e o orgulho
Suas causas, seus efeitos e os meios de destruí-los
Está bem reconhecido que a maioria das misérias humanas tem a sua fonte no egoísmo dos
homens. Então, desde que cada um pensa em si, antes de pensar nos outros, e quer a sua própria
satisfação antes de tudo, cada um procura, naturalmente, se proporcionar essa satisfação, a qualquer
preço, e sacrifica, sem escrúpulo, os interesses de outrem, desde as menores coisas até as maiores, na
ordem moral como na ordem material; daí todos os antagonismos sociais, todas as lutas, todos os
conflitos e todas as misérias, porque cada um quer despojar o seu vizinho.
O egoísmo tem a sua fonte no orgulho. A exaltação da personalidade leva o homem a se
considerar como acima dos outros, crendo-se com direitos superiores, e se fere com tudo o que,
segundo ele, seja um golpe sobre os seus direitos. A importância que, pelo orgulho, liga à sua pessoa,
torna-o naturalmente egoísta.
O egoísmo e o orgulho têm a sua fonte num sentimento natural: o instinto de conservação.
Todos os instintos têm sua razão de ser e sua utilidade, porque Deus nada pode fazer de inútil. Deus
não criou o mal; foi o homem que o produziu pelo abuso que fez dos dons de Deus, em virtude de seu
livre arbítrio. Esse sentimento, encerrado em seus justos limites, portanto, é bom em si; é o exagero
que o torna mau e pernicioso; ocorre o mesmo com todas as paixões que o homem, freqüentemente,
desvia de seu objetivo providencial. De nenhum modo Deus criou o homem egoísta e orgulhoso; criouo
simples e ignorante; foi o homem que se fez egoísta e orgulhoso exagerando o instinto que Deus lhe
deu para a sua conservação.
Os homens não podem ser felizes se não vivem em paz, quer dizer, se não estão animados de
um sentimento de benevolência, de indulgência e de condescendência recíprocos, em uma palavra,
enquanto procurarem se esmagar uns aos outros. A caridade e a fraternidade resumem todas as
condições e todos os deveres sociais; mas supõem a abnegação; ora, a abnegação é incompatível com o
egoísmo e o orgulho; portanto, com seus vícios nada de verdadeira fraternidade, partindo, da igualdade
e da liberdade, porque o egoísta e o orgulhoso querem tudo para eles.
Estarão sempre aí os vermes
roedores de todas as instituições progressistas; enquanto eles reinarem, os sistemas sociais mais
generosos, mais sabiamente combinados, desabarão sob os seus golpes. É belo, sem dúvida, proclamar
o reino da fraternidade, mas para que serve se existe uma causa destruidora? É edificar sobre um
terreno movediço; tanto valeria decretar a saúde para um país insalubre. Num tal país, querendo-se que
os homens se portem bem, não basta enviar-lhe médicos, porque eles morrerão como os outros; é
necessário destruir as causas da insalubridade. Se quereis que vivam como irmãos sobre a Terra, não
basta lhes dar lições de moral; é necessário destruir as causas do antagonismo; é necessário atacar o
princípio do mal: o orgulho e o egoísmo.
Aí está a praga; aí deve se concentrar toda a atenção daqueles
que querem seriamente o bem da Humanidade. Enquanto esses obstáculos subsistirem, verão seus
esforços paralisados, não só por uma resistência de inércia, mas por uma força ativa que trabalhará,
sem cessar, para destruir a sua obra, porque toda idéia grande, generosa e emancipadora, arruína as
pretensões pessoais.
Destruir o egoísmo e o orgulho é coisa impossível, dir-se-á, porque esses vícios são inerentes à
espécie humana.
Se isso fora assim, seria necessário desesperar de todo o progresso moral; no entanto,
quando se considera o homem em suas diferentes idades, não se pode desconhecer um progresso
evidente: portanto, se ele progrediu, pode progredir ainda.
Por outro lado, é que não se encontra
nenhum homem desprovido do orgulho e do egoísmo?
Não se vêem, ao contrário, essas naturezas
generosas nas quais o sentimento de amor ao próximo, de humildade, de devotamento e de abnegação,
parecem inatos?
O número é menor do que o dos egoístas, isto é certo, de outro modo estes últimos
não fariam a lei; mas há deles mais do que se crê, e se parecem tão pouco numerosos é que o orgulho
se põe em evidência, ao passo que a virtude modesta permanece na sombra.
Se, pois, o egoísmo e o
orgulho estivessem nas condições necessárias à Humanidade, como as de se nutrir para viver, não
haveria exceções; o ponto essencial é, pois, chegar a fazer a exceção passar ao estado de regra; para
isso, antes de tudo, trata-se de destruir as causas que produzem e sustentam o mal.
A principal dessas causas se liga, evidentemente, à falsa idéia que o homem faz de sua
natureza, de seu passado e de seu futuro. Não sabendo de onde vem, se crê mais do que não o é; não
sabendo para onde vai, concentra todo o seu pensamento sobre a vida terrestre; ele a vê tão agradável
quanto possível; quer todas as satisfações, todos os gozos: é porque caminha, sem escrúpulos, sobre o
seu vizinho, se este lhe faz obstáculo; mas, para isso, é necessário que ele domine; a igualdade daria a
outros direitos que quer ter sozinho; a fraternidade lhe imporia sacrifícios que estariam em detrimento
de seu bem-estar; a liberdade, ele a quer para si, e não a concede, aos outros, senão quando ela não
leve nenhum prejuízo às suas prerrogativas.
Tendo cada um as mesmas pretensões, disso resultam
conflitos perpétuos, que fazem pagar bem caro alguns dos gozos que venham a se proporcionar.
Que o homem se identifique com a vida futura, e a sua maneira de ver muda completamente,
como a de um indivíduo que não deve permanecer senão poucas horas numa habitação má, e que sabe
que, à sua saída, terá outra magnífica, para o resto de seus dias.
A importância da vida presente, tão triste, tão curta, tão efêmera, se apaga diante do esplendor
do futuro infinito que se abre diante dele. A conseqüência natural, lógica, dessa certeza, é a de
sacrificar um presente fugidio a um futuro durável, ao passo que antes sacrificava tudo ao presente.
Tornando-se a vida futura o seu objetivo, pouco lhe importa ter um pouco mais, ou um pouco menos
neste; os interesses mundanos são os acessórios, em lugar de serem o principal; ele trabalha no
presente tendo em vista assegurar a sua posição no futuro, além disso, sabe em que condições pode ser
feliz.
Pelos interesses mundanos, os homens podem lhe opor obstáculos: é preciso que os afaste, e se
torna egoísta pela força das coisas; se leva suas vistas mais alto, para uma felicidade que nenhum
homem pode entravar, não tem interesse em esmagar ninguém, e o egoísmo não tem mais objeto; mas
resta-lhe sempre o estímulo do orgulho.
A causa do orgulho está na crença que o homem tem de sua superioridade individual; e é aqui
que se faz sentir ainda a influência da concentração do pensamento sobre a vida terrestre.
No homem
que nada vê diante dele, nada depois dele, nada acima dele, o sentimento da personalidade o arrebata, e
o orgulho não tem nenhum contrapeso.
A incredulidade não só não possui nenhum meio de combater o orgulho, mas o estimula e lhe
dá razão negando a existência de um poder superior à Humanidade. O incrédulo não crê senão em si
mesmo; é, pois, natural que ele tenha orgulho; ao passo que, nos golpes que o atingem, ele não vê
senão o acaso e se endireita, aquele que tem a fé, vê a mão de Deus e se inclina. Crer em Deus e na
vida futura é, pois, a primeira condição para moderar o orgulho, mas isso não basta; ao lado do futuro,
é preciso ver o passado para se fazer uma ideia justa do presente.
Para que o orgulhoso cesse de crer em sua superioridade, é preciso lhe provar que ele não é mais do que os outros, e que os outros são tanto quanto ele; que a igualdade é um fato e não, simplesmente, uma bela teoria filosófica; verdades que ressaltam da preexistência da alma e da reencarnação. Sem a preexistência da alma, o homem é levado a crer que Deus o beneficiou excepcionalmente, quando crê em Deus; quando não crê, rende graças ao acaso e ao seu próprio mérito.
A preexistência, iniciando-o na vida anterior da alma, lhe ensina a distinguir a vida espiritual infinita, da vida corpórea, temporária; sabe, por aí, que as almas saem iguais das mãos do Criador; que têm um mesmo ponto de partida e um mesmo objetivo, que todas devem alcançar, em mais ou menos tempo segundo os seus esforços; que ele mesmo não chegou ao que é senão depois de ter, por muito tempo e penosamente, vegetado como os outros nos graus inferiores: que não há, entre as mais atrasadas e as mais avançadas, senão uma questão de tempo; que as vantagens de nascimento são puramente corpóreas e independentes do Espírito; que o simples proletário pode, numa outra existência, nascer sobre um trono, e o mais poderoso renascer proletário.
Se não considera senão a vida corpórea, vê as desigualdades sociais do momento; elas o ferem; mas se leva seus olhares sobre o conjunto da vida do Espírito, sobre o passado e sobre o futuro, desde o ponto de partida até o ponto de chegada, essas desigualdades se apagam, e reconhece que Deus não favoreceu a nenhum de seus filhos em prejuízo dos outros; que fez parte igual a cada um e não aplainou o caminho mais para uns do que para outros; que aquele que é menos avançado do que ele sobre a Terra, pode chegar antes dele, se trabalha mais do que ele pelo seu aperfeiçoamento; reconhece, enfim, que cada um não chegando senão pelos seus esforços pessoais, o princípio de igualdade se acha ser, assim, um princípio de justiça e uma lei da Natureza, diante das quais cai o orgulho do privilégio.
A reencarnação,provando que os Espíritos podem renascer em diferentes condições sociais, seja como expiação, seja como prova, ensina que naquele que se trata com desdém, pode-se encontrar um homem que foi nosso superior ou nosso igual numa outra existência, uma amigo ou um parente.
Se o homem o soubesse, tratá-lo-ia com respeito, mas, então, não teria nenhum mérito; e, pelo contrário, se soubesse que seu amigo atual foi seu inimigo, seu servidor ou seu escravo, o repeliria; ora, Deus não quis que isso fosse assim, por isso lançou um véu sobre o passado; desta maneira, o homem é levado a ver, em todos, irmãos e seus iguais; daí uma base natural para a fraternidade; sabendo que ele mesmo poderá ser tratado como houver tratado os outros, a caridade se torna um dever e uma necessidade, fundados sobre a própria Natureza.
Jesus colocou o princípio da caridade, da igualdade e da fraternidade; fez dele uma condição expressa de salvação; mas estava reservado à terceira manifestação da vontade de Deus, ao Espiritismo, pelo conhecimento que dá da vida espiritual, pelos horizontes novos que descobre e as leis que revela, sancionar esse princípio, provando que não é somente uma doutrina moral, mas uma lei da Natureza, e que está no interesse do homem praticá-lo.
Ora, ele o praticará quando, cessando de ver no presente o começo e o fim, compreenderá a solidariedade que existe entre o presente, o passado e o futuro. No campo imenso do infinito que o Espiritismo lhe faz entrever, sua importância pessoal se anula; compreende que sozinho não é nada e nada pode; que todos têm necessidade uns dos outros; duplo revés para o seu orgulho e o seu egoísmo.
Mas, para isso, lhe é necessária a fé, sem a qual ficará forçosamente na rotina do presente; não a fé cega que foge da luz, restringe as idéias, e, por isso mesmo, mantém o egoísmo, mas a fé inteligente, raciocinada, que quer a claridade e não as trevas, que rasga temerariamente o véu dos mistérios e alarga o horizonte; é essa fé, primeiro elemento de todo o progresso, que o Espiritismo lhe traz, fé robusta porque está fundada sobre a experiência e os fatos, porque lhe dá provas palpáveis da imortalidade de sua alma, lhe ensina de onde vem, para onde vai, e porque está sobre a Terra; porque, enfim, ela fixa suas idéias incertas sobre seu passado e sobre seu futuro.
Uma vez entrado largamente nesse caminho, o egoísmo e o orgulho, não tendo mais as mesmas causas de superexcitação, se extinguirão, pouco a pouco, por falta de objetivo e de alimento, e todas as relações sociais se modificarão sob o império da caridade e da fraternidade bem compreendidas.
Isso pode chegar por uma mudança brusca?
Não, isso é impossível: nada é brusco na Natureza; jamais a saúde se torna, subitamente, em uma doença; entre a doença e a saúde há sempre a convalescênça.
O homem não pode, pois, instantaneamente, mudar seu ponto de vista, e levar os seus olhares da Terra ao céu; o infinito o confunde e o ofusca; é-lhe necessário o tempo para assimilar as idéias novas.
O Espiritismo é, sem contradita, o mais poderoso elemento moralizador, porque mina o egoísmo e o orgulho pela base, dando um ponto de apoio à moral: fez milagres de conversões; não são ainda, é verdade, senão cuidados individuais,e freqüentemente parciais; mas o que produziu sobre os indivíduos é a garantia do que produzirá um dia sobre as massas. Ele não pode arrancar as más ervas de repente; dá a fé; a fé é uma boa semente, mas é necessário, a essa semente, o tempo para germinar e dar frutos; eis porque todos os espíritas não são ainda perfeitos.
Ele pegou o homem no meio da vida, no fogo das paixões, na força dos preconceitos, e se, em tais circunstâncias, operou prodígios, que será quando o tomar em seu nascimento, virgem de todas as impressões malsãs; quando aquele receber a caridade desde a meninice, e for embalado pela fraternidade; quando, enfim, toda uma geração será elevada e nutrida nas idéias que a razão aumenta, fortificará em lugar de desunir?
Sob o império dessas idéias, tornadas a fé para todos, o progresso, não encontrando mais obstáculo no egoísmo e no orgulho, as próprias instituições se reformarão e a Humanidade avançará rapidamente para os destinos que lhe foram prometidos sobre a Terra, esperando os do céu. Liberdade, Igualdade, Fraternidade
Liberdade, igualdade, fraternidade, estas três palavras são, por si sós, o programa de toda uma ordem social, que realizaria o progresso mais absoluto da Humanidade, se os princípios que representam pudessem receber sua inteira aplicação.
Vejamos os obstáculos que, no estado atual da sociedade, podem a isso se opor e, ao lado do mal, procuremos o remédio. A fraternidade, na rigorosa acepção da palavra, resume todos os deveres dos homens relativamente uns aos outros; ela significa: devotamento, abnegação, tolerância, benevolência, indulgência; é a caridade evangélica por excelência e a aplicação da máxima: "Agir para com os outros como gostaríamos que os outros agissem conosco."
A contrapartida é o Egoísmo. A fraternidade diz: "Cada um por todos e todos por um." O egoísmo diz: "Cada um por si."
Sendo essas duas qualidades a negação uma da outra, é tão impossível a um egoísta agir fraternalmente, para com os seus semelhantes, quanto o é para um avarento ser generoso, a um homem pequeno alcançar a altura de um homem grande. Ora, sendo o egoísmo a praga dominante da sociedade, enquanto ele reinar dominador, o reino da verdadeira fraternidade será impossível; cada um quererá da fraternidade em seu proveito, mas não a quererá para fazê-la em proveito dos outros; ou, se isso faz, será depois de estar seguro de que não perderá nada.
Considerada do ponto de vista de sua importância para a realização da felicidade social, a fraternidade está em primeira linha: é a base; sem ela não poderia existir nem igualdade e nem liberdade sérias; a igualdade decorre da fraternidade, e a liberdade é a conseqüência das duas outras.
Com efeito, suponhamos uma sociedade de homens bastante desinteressados, bons e benevolentes para viverem, entre si, fraternalmente, não haveria entre eles nem privilégios nem direitos excepcionais, sem o que não haveria ali fraternidade.
Tratar alguém como irmão, é tratá-lo de igual para igual; é querer-lhe o que desejaria para si mesmo; num povo de irmãos, a igualdade será a conseqüência de seus sentimentos, de sua maneira de agir, e se estabelecerá pela força das coisas. Mas qual é o inimigo da igualdade? É o orgulho.
O orgulho que, por toda a parte, quer primar e dominar, que vive de privilégios e de exceções, pode suportar a igualdade social, mas não a fundará jamais e a destruirá na primeira ocasião. Ora, sendo o orgulho, ele também, uma das pragas da sociedade, enquanto não for destruído, oporá uma barreira à verdadeira igualdade.
A liberdade, dissemos, é filha da fraternidade e da igualdade; falamos da liberdade legal e não da liberdade natural que é, por direito, imprescritível para toda criatura humana, desde o selvagem ao homem civilizado. Vivendo os homens como irmãos, com os direitos iguais, animados de um sentimento de benevolência recíproco, praticarão entre si a justiça, não procurarão nunca se fazerem mal, e não terão, conseqüentemente, nada a temer uns dos outros.
A liberdade será sem perigo, porque ninguém pensará em dela abusar em prejuízo de seus semelhantes. Mas como o egoísmo que quer tudo para si, o orgulho que quer sempre dominar, dariam a mão à liberdade que os destronaria?
Os inimigos da liberdade são, pois, ao mesmo tempo, o egoísmo e o orgulho, como o são da igualdade e da fraternidade. A liberdade supõe a confiança mútua; ora, não poderia haver confiança entre pessoas movidas pelo sentimento exclusivo da personalidade; não podendo se satisfazer senão às expensas de outrem, sem cessar, estão em guarda uns contra os outros.
Sempre com medo de perder o que chamam seus direitos, a dominação é a condição mesma de sua existência, por isso armarão sempre ciladas à liberdade, e a abafarão tanto tempo quanto o puderem. Esses três princípios são, pois, como o dissemos, solidários uns com os outros e se servem mutuamente de apoio; sem sua reunião, o edifício social não poderia estar completo. A fraternidade praticada em sua pureza não poderia estar só, porque sem a igualdade e a liberdade não há verdadeira fraternidade.
A liberdade sem a fraternidade dá liberdade de ação a todas as más paixões, que não têm mais freio; com a fraternidade, o homem não faz nenhum mau uso de sua liberdade: é a ordem; sem a fraternidade, ele a usa para dar curso a todas as suas torpezas: é a anarquia, a licença. É por isso que as nações mais livres são forçadas a fazerem restrições à liberdade.
A igualdade sem a fraternidade conduz aos mesmos resultados, porque a igualdade quer a liberdade; sob pretexto de igualdade, o pequeno abate o grande, para se substituir a ele, e se torna tirano a seu turno; isso não é senão um deslocamento do despotismo. Segue-se que, até que os homens estejam imbuídos do sentimento da verdadeira fraternidade, falta tê-los na servidão? Que sejam impróprios às instituições fundadas sobre os princípios de igualdade e de liberdade? Semelhante opinião seria mais do que um erro; seria absurda.
Não se espera que uma criança haja feito todo o seu crescimento para fazê-la caminhar. Quem, aliás, a tem mais freqüentemente em tutela?
São homens de idéias grandes e generosas, guiados pelo amor ao progresso?
Aproveitando da submissão de seus inferiores, para desenvolver neles o senso moral, e elevá-los, pouco a pouco, à condição de homens livres?
Não; são, na maioria, homens ciosos de seu poder, à ambição e à cupidez dos quais outros homens servem de instrumento, mais inteligentes do que animais, e que, para esse efeito, em lugar de emancipá-los os têm, o maior tempo possível, sob o jugo e na ignorância.
Mas essa ordem de coisas muda por si mesma pela força irresistível do progresso. A reação é, às vezes, violenta e tanto mais terrível quanto o sentimento de fraternidade, imprudentemente abafado, não vem interpor um poder moderador; a luta se estabelece, entre aqueles que querem agarrar e aqueles que querem reter; daí um conflito que se prolonga, freqüentemente, durante séculos.
Um equilíbrio factício se estabelece enfim; há melhoria; mas sente-se que as bases sociais não estão sólidas; o solo treme a cada instante sob os passos, porque não é, ainda, o reino da liberdade e da igualdade sob a égide da fraternidade, porque o orgulho e o egoísmo estão sempre ali, levando ao fracasso os esforços dos homens de bem.
Todos vós que sonhais com essa idade de ouro para a Humanidade, trabalhai, antes de tudo, na base do edifício, antes de querer coroar-lhe a cumeeira; dai-lhe por base a fraternidade em sua mais pura acepção; mas, para isso, não basta decretá-la e inscrevê-la sobre uma bandeira; é preciso que ela esteja no coração e não se muda o coração dos homens com decretos.
Do mesmo modo que, para fazer um campo frutificar, é preciso arrancar-lhe as pedras e os espinheiros, trabalhai sem descanso para extirpar o vírus do orgulho e do egoísmo, porque aí está a fonte de todo mal, o obstáculo real ao reino do bem; destruí nas leis, nas instituições, nas religiões, na educação, até os últimos vestígios, os tempos de barbárie e de privilégios, e todas as causas que mantêm e desenvolvem esses eternos obstáculos ao verdadeiro progresso, que se recebe, por assim dizer, desde a meninice e que se aspira por todos os poros na atmosfera social; só então os homens compreenderão os deveres e os benefícios da fraternidade; então, também, se estabelecerão por si mesmos, sem abalos e sem perigo, os princípios complementares da igualdade e da liberdade.
A destruição do egoísmo e do orgulho é possível?
Dizemos alta e ousadamente SIM, de outro modo seria preciso colocar uma suspensão ao progresso da Humanidade.
O homem cresce em inteligência, é um fato incontestável; chegou ao ponto culminante que não poderia ultrapassar?
Quem ousaria sustentar essa tese absurda?
Progride ele em moralidade?
Para responder a esta pergunta, basta comparar as épocas de um mesmo país.
Por que, pois, teria antes alcançado o limite do progresso moral do que do progresso intelectual?
Sua aspiração, para uma ordem de coisas melhor, é um indício da possibilidade de a isso chegar. Aos homens progressistas cabe ativar o movimento pelo estudo e pela prática dos meios mais eficazes.
Estudos Espíritas Capítulo 11 - Trabalho Joanna de Ângelis Conceito
- Genericamente o vocábulo trabalho pode ser definido como: "Ocupação em alguma obra ou ministério; exercício material ou intelectual para fazer ou conseguir alguma coisa. O trabalho, porém, é lei da Natureza mediante a qual o homem forja o próprio progresso desenvolvendo as possibilidades do meio ambiente e um que se situa, ampliando os recursos de preservação da espécie, pela reprodução, o homem vê-se coagido à obediência à lei do trabalho.
O trabalho, no entanto, não se restringe apenas ao esforço de ordem material, física, mas, também, intelectual pelo labor desenvolvido, objetivando as manifestações da Cultura, do Conhecimento, da Arte, da Ciência.
Muito diferente da força aplicada pelo animal, o trabalho no homem objetiva a transformação para melhor das condições e do meio onde se encontra situado, desdobrando a capacidade criativa, de modo a atingir as altas expressões da beleza e da imortalidade, libertando-se, paulatinamente, das formas grosseiras e primárias em que transita para atingir a plenitude da perfeição.
O movimento e o esforço a que são conduzidos os animais e que por generalização passam a ser denominados trabalho, constituem atividade de repetição motivada pelo instinto de "conservação da vida", sem as resultantes realizações criadoras, que facultam o aprimoramento, o progresso, a beleza inerentes ao ser humano. Enquanto os animais agem para prover a subsistência imediata o homem labora criando, desenvolvendo as funções da inteligência que o agigantam, conseguindo meios e recursos novos para aplicação na faina de fazê-lo progredir.
A princípio, o homem, à semelhança do próprio animal, procurava apenas prover as necessidades imediatas, produzindo um fenômeno eminentemente predatório, numa vida nômade, em que se utilizava das reservas animais e vegetais para a caça, a pesca a colheita de frutos silvestres, seguindo adiante, após a destruição das fontes naturais de manutenção. No período da pedra lascada sentiu-se impelido a ampliar os braços e as pernas para atingir as metas da aquisição de recursos, recorrendo a instrumentos rudes, passando mais tarde à agricultura para, da terra, em regime de sociedade, extrair os bens que lhe facultassem a preservação da vida, prosseguindo, imediatamente, a criação de rebanhos que domesticou, capazes de propiciar-lhe relativa abundância, pelo resultante do armazenamento dos excedentes da colheita e do abate animal, deixando de ser precárias as condições, assaz primitivas, em que vivia.
Com a utilização dos instrumentos mais aprimorados para a caça, a pesca, a agricultura, a criação de rebanhos, as atividades tornaram-se rendosas, facultando a troca de mercadorias como primeiro passo para o comércio e posteriormente para a indústria, de modo a fomentar recursos sempre novos e cada vez mais complexos, pelos quais libertava-se paulatinamente das dificuldades iniciais para levantar a base do equilíbrio social, pela previsão e recursos de previdência que sofria com freqüência: secas, guerras, enfermidades. No passado, porém, o trabalho se apresentava para as classes nobres como uma desonra, sendo reservado apenas aos "braços escravos", que se encarregavam de todas as tarefas, de modo a que os dominadores se permitissem a ociosidade brilhante, podendo-se valorizar os recursos dos homens pelo número de escravos e servos de que podiam dispor. Mesmo a cultura da inteligência era transmitida, não raro, por homens ferreteados pela escravidão, e o desenvolvimento das artes, das atividades domésticas encontrava-se em posição subalterna de servilismo desprezado, conquanto indispensável. O trabalho, porém, apresenta-se ao homem como meio de elevação e como expiação de que tem necessidade para resgatar o abuso das forças, quando entregues à ociosidade ou ao crime, na sucessão das existências pelas quais evolute.
Não fora o trabalho e o homem permaneceria na infância primitiva, sendo por Deus muitas vezes facultado ao fraco de forças físicas os inapreciáveis recursos da inteligência, mediante a qual granjeia progresso e respeito, adquirido independência econômica, valor social e consideração, contribuindo poderosamente para o progresso de todos. Com o irrompimento da técnica, que multiplicou os meios para a atividade do homem, na sociedade, veio inevitavelmente a divisão social do próprio trabalho, criando as classes, hoje, como ontem, empenhadas em lutas terrificantes e crescentes. A lei do trabalho, porém, impõe-se a todos e ninguém fugirá dela impunemente, deixando de ser surpreendido mais adiante... A homem algum é permitido usufruir os benefícios do trabalho de outrem sem a justa retribuição e toda exploração imposta pelo usuário representa cárcere e algema para si mesmo, na sucessão das existências inevitáveis a que se encontra impelido a utilizar.
Do trabalho mecânico, rotineiro, primitivo, puro e simples, à automação, houve um progresso gigante que ora permite ao homem o abandono das tarefas rudimentares, entregues a máquinas e instrumentos que ele mesmo aperfeiçoou, concedendo-lhe tempo para a genialidade criativa e a multiplicação em níveis cada vez mais elevados. Sendo o trabalho uma lei natural, o repouso é a conseqüente conquista a que o homem faz jus para refazer as forças e continuar em ritmo de produtividade.
O repouso se lhe impõe como prêmio ao esforço despendido, sendo-lhe facultado o indispensável sustento nos dias da velhice, quando diminuem o poder criativo, as forças e a agilidade na execução das tarefas ligadas à subsistência.
Teorias Econômicas do Trabalho e Justiça Social - Duas são as teorias econômicas do trabalho na estrutura da sociedade: o trabalho-valor que se consusbstancia nas teorias de Adam Smith, JeanBaptiste Say e David Ricardo, que pugnavam pela assertiva de que "o trabalho cria o valor econômico" e a outra, a do trabalho-produção, expressa através dos expoentes da denominada Escola Marginalista, que consideram o trabalho como um dos "fatores da produção, cujo valor é medido pelo valor do produto que cria", considerando-se primacialmente a sua utilidade aplicada ao mercado de consumo. Com a Revolução Industrial e o advento da máquina que modificaram toda a estrutura do trabalho realizado pelo homem, a tese do trabalho-valor sobrepôs-se e foi adotada por Karl Marx, objetivando o trabalhador, nas suas necessidades de reposição do desgaste físico (ou mental), conseqüência direta e imediata da atividade exercida, sendo, assim, o trabalho, inexaurível fonte de todo o progresso humano.
Com o desenvolvimento das Ciências Sociais e o advento das Entidades Previdenciárias e Assistenciais, o homem passou a beneficiar-se de uma regulamentação legal sobre o tempo de trabalho, horário, remuneração extraordinária e a indispensável aposentadoria, observados os requisitos essenciais, assistência médico-odontológica, pensão para a família, quando ocorre o óbito, invalidez remunerada em estrutura de justiça.
As lutas entre patrão e empregado começaram a ser examinadas com maior eqüidade, resolvendo-se em Casas de Justiça os graves problemas a que se viam constrangidos os menos afortunados pelos valores aquisitivos, que, em face da permanente conjuntura econômica a que se vêem a braços os diversos países, eis que com a moeda ganha sempre se adquire menos utilidades, comprimindo-os até o desespero, fomentando a anarquia e o desajustamento comunitário.
Dividido o tempo entre trabalho e lazer, ação e espairecimento, ampliam-se as possibilidades da existência do homem, que, então, frui a decorrência do progresso na saúde, nas manifestações artísticas, na cultura, no prazer, dispondo de tempo para as atividades espirituais, igualmente valiosas, senão indispensáveis para a sua paz interior.
Mediante o trabalho-remunerado o homem modifica o meio, transforma o habitat, cria condições de conforto. Através do trabalho-abnegação, do qual não decorre troca nem permuta de remuneração, ele se modifica a si mesmo, crescendo no sentido moral e espiritual. Por um processo ele se desenvolve na horizontal e se melhora exteriormente; pelo outro, ascende no sentido vertical da vida e se transforma de dentro para fora.
Utilizando-se do primeiro recurso conquista simpatia e respeito, gratidão e amizade. Através da autodoação consegue superar-se, revelando-se instrumento da Misericórdia Divina na construção da felicidade de todos.
Trabalho e Jesus - Fazendo-se carpinteiro e dedicando-se à profissão na elevada companhia de José, o Mestre laborava ativamente, ensinando com o exemplo e respeito ao trabalho, como dever primeiro para a manutenção e preservação da vida, mediante a atividade honrada. Em todo o seu ministério de amor e abnegação tem relevante papel, verdadeiro trabalho de autodoação até sacrifício da própria vida, sem paralelo em toda a História. Seus discípulos, a posteriori, fizeram do trabalho expressão de dignificação, tornando-se "escravos do Senhor" e servos de todos, oferecendo o labor das próprias mãos para a subsistência orgânica, enquanto se "afadigavam" na sementeira da luz. Seu exemplo e Suas lições erguem os escravos que jazem no potro da miséria e dá-lhes suprema coragem no exercício do próprio trabalho através do qual encontram energiar para superar as fracas forças, tornando-se fortes e inatingíveis. Infundem coragem, estimulando o trabalho-serviço fraternal, de modo a manter a comunidade unida em todos os transes. Ensinam esperança, utilizando o trabalho-redenção, por cujo meio o espírito libra acima das próprias limitações e se liberta das malhas da ociosidade e do mal. Agora, quando as luzes do Consolador se acendem na Terra da atualidade, encontrando o homem em pleno labor regulamentado por leis de justiça e previdência, eis que soam no seu espírito as clarinadas do trabalho mantenedor do progresso geral de todos, utilizando-se dos valores da fé para a construção do Mundo Melhor em que o amor dirima as dúvidas, em torno da vida imortal, e a caridade substitua em toda a plenitude a filantropia, à semelhança do que ocorre nos Mundos Felizes onde o trabalho, em vez de ser impositivo, é conquista do homem livre que sabe agir no bem infatigável, servindo sempre e sem cessar. Estudo e meditação: "A necessidade do trabalho é lei da Natureza? " "O trabalho é lei da Natureza, por isso mesmo que constitui uma necessidade, e a civilização obriga o homem a trabalhar mais, porque lhe aumenta as necessidades e os gozos." (O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 674.) "Com efeito, o homem tem por missão trabalhar pela melhoria material do planeta. Cabe-lhe desobstruí-lo, saneá-lo, dispô-lo para receber um dia toda a população que a sua extensão comporta. Para alimentar essa população que cresce incessantemente, preciso se faz aumentar a produção. Se a produção de um país é insuficiente, será necessário buscá-la fora.
Por isso mesmo, as relações entre os povos constituem uma necessidade. A fim de mais as facilitar, cumpre sejam destruídos os obstáculos materiais que os separam e tornadas mais rápidas as comunicações.
Para trabalhos que são obra dos séculos, teve o homem de extrair os materiais até das entranhas da terra; procurou na Ciência os meios de os executar com maior segurança e rapidez. Mas, para os levar a efeito, precisa de recursos: a necessidade fê-lo criar a riqueza, como o fez descobrir a Ciência. A atividade que esses mesmos trabalhos impõem lhe amplia e desenvolve a inteligência, e essa inteligência que se concentra, primeiro, na satisfação das necessidades materiais, o ajudará mais tarde a compreender as grandes verdades morais.
Sendo a riqueza o meio primordial de execução, sem ela não mais grandes trabalhos, nem atividade, nem estimulante, nem pesquisas. Com razão, pois, é a riqueza considerada elemento de progresso." (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec, cap. XVI, item 7.)
Texto extraído do livro Estudos Espíritas, de Divaldo Pereira Franco pelo espírito de Joanna de Ângelis. LIVRO ESTUDANDO O EVANGELHO MARTINS PERALVA Capítulo 3 Renovação Brilhe a vossa luz.
O supremo objetivo do homem, na Terra, é o da sua própria renovação. Aprender, refletir e melhorar-se, pelo trabalho que dignifica
— eis a nossa finalidade, o sentido divino de nossa presença no mundo.
Descendo o Cristo das esferas de luz da Espiritualidade Superior à Terra, teve por escopo orientar a Humanidade na direção do aperfeiçoamento.
―Brilhe a vossa luz‖
— eis a palavra de ordem, enérgica e suave, de Jesus, a quantos Lhe herdaram o patrimônio evangélico, trazido ao mundo ao preço do Seu próprio sacrifício.
A infinita ternura de Sua Angelical Alma sugere-nos, incisiva e amorosamente, o esforço benéfico:
―Brilhe a vossa luz.‖ O interesse do Senhor é o de que os Seus discípulos, de ontem, de hoje e de qualquer tempo, sejam enobrecidos por meio de uma existência moralizada, esclarecida, fraterna.
O Evangelho aí está, como presente dos céus, para que o ser humano se replete com as suas bênçãos, se inunde de suas luzes, se revigore com as suas energias, se enriqueça com os seus ensinos eternos.
O Espiritismo, em particular, como revivescência do Cristianismo, também aí está, ofertando-nos os oceânicos tesouros da Codificação.
Pode-se perguntar: De que mais precisa o homem, para engrandecer-se, pela cultura e pelo sentimento, se lhe não faltam os elementos de renovação, plena, integral, positiva?...
Que falta ao homem moderno, usufrutuário de tantas bênçãos, para que ―brilhe a sua luz?.
A renovação do homem, sob o ponto de vista moral, intelectual e espiritual, é difícil, sem dúvida. Mas é francamente realizável.
É indispensável, tão somente, disponha-se ele ao esforço transformativo, com a consequente utilização desses recursos, desses meios, desses elementos que o Evangelho e o Espiritismo lhe fornecem exuberantemente, farta e abundantemente, sem a exigência de qualquer outro preço a não ser o preço de uma coisa bem simples: a boa vontade.
A disposição de auto-melhoria.
O homem, para renovar-se, tem que estabelecer um programa tríplice, como ponto de partida para a sua realização íntima, para que
―brilhe a sua luz‖, baseado no Estudo, na Meditação e no Trabalho.
ESTUDO: — O estudo se obtém através da leitura do Evangelho, dos livros da Doutrina Espírita e de quaisquer obras educativas, religiosas ou filosóficas, que o levem a projetar a mente na direção dos ideais superiores. O estudo deve ser meditado, assimilado e posto em prática, a fim de que se transforme em frutos de renovação efetiva, positiva e consciente: ―Conhecereis a Verdade e a Verdade vos fará livres.‖
MEDITAÇÃO:
— A meditação é o ato pelo qual se volve o homem para dentro de si mesmo, onde encontrará a Deus, no esplendor de Sua Glória, na plenitude do Seu Poder, na ilimitada expansão do Seu Amor: ―O Reino de Deus está dentro de vós.‖ Através da prece, na meditação, obterá o homem a fé de que necessita para a superação de suas fraquezas e a esperança que lhe estimulará o bom ânimo, na arrancada penosa, bem como o conforto e o bem-estar que lhe assegurarão, nos momentos difíceis, o equilíbrio interior. Na meditação e na prece haurirá o homem a sua própria tonificação, o seu próprio fortalecimento moral e a inspiração para o bem.
TRABALHO:
— O trabalho, em tese, para o ser em processo de evolução, configura-se sob três aspectos principais: material, espiritual, moral. Através do trabalho material, prôpriamente dito, dignifica-se o homem no cumprimento dos deveres para consigo mesmo, para com a família que Deus lhe confiou, para com a sociedade de que participa. Pelo trabalho espiritual, exerce a fraternidade com o próximo e aperfeiçoa-se no conhecimento trancendente da alma imortal. No campo da atividade moral, lutará, simultâneamente, por adquirir qualidades elevadas, ou, se for o caso, por sublimar aquelas com que já se sente aquinhoado. Em resumo: aquisição, cultivo e ampliação de qualidades superiores que o distanciem, em definitivo, da animalidade em que jaz há milênios de milênios:
―É na vossa perseverança que ganhamos as vossas almas.‖ A estrada é difícil, o caminho é longo, repleto de espinhos e pedras, de obstáculos e limitações, porém, a meta é perfeitamente alcançável. Uma coisa, apenas, é indispensável: um pouco de boa vontade. Boa vontade construtiva, eficiente, positiva. O resto virá, no curso da longa viagem...
LIVRO REPORTAGENS DE ALÉM-TÚMULO CHICO XAVIER/HUMBERTO DE CAMPOS CAPÍTULO 20 - O VALOR DO TRABALHO
Ninguém contestava os nobres sentimentos de Cecília Montalvão; entretanto, era de todos sabida sua aversão ao trabalho. No fundo, excelente criatura cheia de conceitos filosóficos, por indicar ao próximo os melhores caminhos. Palestra fácil e encantadora, gestos espontâneos e afetuosos, seduzia quem lhe escutasse o verbo carinhoso. Se a família adotasse outros princípios que não fossem os do Espiritismo cristão, Cecília propenderia talvez à vida conventual. Assim, não ocultava sua admiração pelas moças que, até hoje, de quando em quando se recolhem voluntariamente à sombra do claustro.
Mais por ociosidade que por espírito de adoração a Deus, entrevia nos véus freiráticos o refúgio ideal. No entanto, porque o Espiritismo não lhe possibilitava ensejo de ausentar-se do ambiente doméstico, a pretexto de fé religiosa, cobrava-se em longas conversações sobre os mundos felizes.
Dedicava-se, fervorosa, a toda expressão literária referente às esferas de paz reservadas aos que muito sofreram nos serviços humanos. As mensagens do Além, que descrevessem tais lugares de repouso, eram conservadas com especial dedicação. As descrições dos planetas superiores causavam-lhe arroubos indefiníveis.
Cecília não cuidava de outra coisa que não fosse a antevisão das glórias celestiais. Embalde a velha mãezinha a convocava à lavanderia ou à copa. Nem mesmo nas ocasiões em que o genitor se recolhia ao leito, tomado de tenaz enxaqueca, a jovem abandonava semelhantes atitudes de alheamento às tarefas necessárias. Não raro discutia sobre as festividades magnificentes a que teria direito, após a morte do corpo. Ao seu pensar, o círculo evolutivo que a esperava devia ser imenso jardim de Espíritos redimidos, povoado de perfumes e zéfiros harmoniosos.
No grupo íntimo de preces da família, costumava cooperar certa entidade generosa e evolvida, que se dava a conhecer pelo nome de Eliezer. Cecília interpretava-lhe as advertências de modo puramente individual. Se o amigo exortava ao trabalho, não admitia que a indicação se referisse a serviços na Terra. – Este planeta – dizia enfaticamente – é lugar indigno, escura paragem de almas criminosas e enfermas. Seria irrespirável o ar terrestre se não fora o antegozo dos mundos felizes. Oh! Como deve ser sublimes vida em Júpiter, a beleza dos dias em Saturno, seguidos de noites iluminadas de anéis resplandecentes! O pântano terrestre envenena as almas bem formadas e não poderemos fugir à repugnância e ao tédio doloroso!...
– Mais, minha filha – objetava a genitora complacente –, não devemos adotar opiniões tão extremistas. Não é o planeta inútil e mau assim. Não será justo interpretar nossa existência terrena como fase de preparação educativa? Sempre notei que qualquer trabalho, desde que honesto, é título de glória para a criatura...
Todavia, antes que a velha completasse os conceitos, voltava a filha intempestivamente, olvidando carinhosas observações de Eliezer:
– Nada disso! A senhora, mamãe, cristalizada como se encontra, entre pratos e caçarolas, não me poderá compreender. Suas observações resultam da rotina cruel, que se esforça por não quebrar. Este mundo é cárcere sombrio, onde tudo é miséria angustiosa e creio mesmo que o maior esforço, por extinguir sofrimentos, seria igual ao de alguém que desejasse apagar um vulcão com algumas gotas dágua.
Tudo inútil. Estou convencida de que a Terra foi criada para 79 triste destinação. Só a morte física pode restituir-nos a liberdade. Transportar-nos-emos a esferas ditosas, conheceremos paraísos iluminados e sem-fim. A senhora Montalvão contemplava a filha, lamentando-lhe a atitude mental, e, esganando os móveis, por não perder tempo, respondia tranquila, encerrando a conversa: – Prefiro crer, minha filha, que tanto a vela de sebo, como a estrela luminosa, representam dádivas de Deus às criaturas.
E, se não sabemos valorizar ainda a vela pequenina que está neste mundo, como nos atreveremos a invadir a grandeza dos astros? E antes que a moça voltasse a considerações novas, a bondosa genitora corria à cozinha, a cuidar do jantar.
Qualquer tentativa, tendente a esclarecer a jovem, redundava infrutífera. Solicitações enérgicas dos pais, pareceres criteriosos dos amigos, advertências do plano espiritual, eram relegados a completo esquecimento. Fervorosa admiradora da vida e obras de Teresa de Jesus, a notável religiosa da Espanha do século XVI, Cecília endereçava-lhe ardentes rogativas, idealizando a missionária do Carmelo num jardim de delicias, diariamente visitada por Jesus e seus anjos. Não queria saber se a grande mística trabalhava, ignorava-lhe as privações e sofrimentos, para só recordá-la em genuflexão ao pé dos altares. Acentuando-se-lhe a preguiça mental, vivia segregada, longe de tudo e de todos. Essa atitude influía vigorosamente no seu físico, e muito antes de trinta anos Cecília regressava ao plano espiritual, absolutamente envolvida na atmosfera de ilusões. Por isso mesmo, dolorosas lhe foram as surpresas da vida real. Despertou além-túmulo, sem lobrigar vivalma. Depois de longos dias solitários e tristes, a caminhar sem destino, encontrou uma Colônia espiritual, onde, no entanto, não havia criaturas em ociosidade. Todos trabalhavam afanosamente. Pediu, receosa, admissão à presença do respectivo diretor. Recebeu-a generoso ancião, em espaçoso recinto.
Observando-lhe, porém, as lânguidas atitudes, o velhinho amorável sentenciou:
– Minha filha, não posso hoje dispor de muito tempo ao seu lado, pelo que espero manifeste seus propósitos sem delongas. Estupefata ante o que ouvia, ela expôs suas mágoas e desilusões, com lágrimas amargurosas. Supunha que após a morte do corpo não houvesse trabalho. Estava confundida em angustioso abatimento.
Sorriu o ancião benévolo e acrescentou:
– Essas fantasias são neblinas no céu dos pensamentos. Esqueça-as, bondosa menina. Não se gaste em referências pessoais. E entremostrando preocupação de serviço, concluía:
– Por não termos descanso para hoje, gostaria dissesse em que lhe posso ser útil. Desapontada, lembrou a jovem a bondade de Eliezer e explicou o desejo de encontrá-lo. O velhinho pensou alguns momentos e esclareceu:
– Não disponho de auxiliares que possam ajudá-la, mas posso orientá-la quanto à direção que precisa tomar. Colocada a caminho, Cecília Montalvão viu-se perseguida de elementos inferiores; figuras repugnantes apresentavam-se-lhe na estrada, perguntando pelas regiões de repouso. Depois de emoções amargas, chegou à antiga residência, onde os familiares não lhe perceberam a nova forma. Ia retirar-se em pranto, quando viu alguém sair da cozinha num halo de luz.
Era o generoso Eliezer que a ela se dirigia com sorriso afetuoso. Cecília caiu-lhe nos braços fraternais e queixou-se, lacrimosa :
– Ah! meu venerando amigo, estou abandonada de todos. Compadecei-vos de mim!... Guiai-me, por caridade, aos caminhos da paz!...
– Acalma-te – murmurou o benfeitor plácido e gentil
–, hoje estou bastante ocupado; entretanto, aconselho-te a orar fervorosamente, renovando resoluções. – Ocupado?
– bradou a jovem, desesperada
– não sois instrutor na revelação espiritual?
– Sim, sim, de dias a dias coopero no serviço das verdades divinas, mas tenho outras responsabilidades a atender.
– E que tereis no dia de hoje, em caráter tão imperativo, abandonando-me também à maneira dos outros?
– interrogou a recém-desencarnada revelando funda revolta.
– Devo auxiliar tua mãezinha nos encargos domésticos
– ajuntou Eliezer brandamente
–, logo mais tenho serviço junto a irmãos nossos. Não te recordas do tintureiro da esquina próxima? Preciso contribuir no tratamento da filha, que se feriu no trabalho, ontem à noite, por excesso de fadiga no ganha-pão.
Lembras-te do nosso Natércio, o pedreiro?
O pobrezinho caiu hoje de grande altura, machucou-se bastante e aguarda-me no hospital. A interlocutora estava envergonhada. Somente agora se reconhecia vítima de si mesma.
– Não poderíeis localizar-me aqui, auxiliando a mamãe?
– perguntou suplicante.
– É impossível, por enquanto
– esclareceu o amigo solícito
–, só podemos cooperar com êxito no trabalho para cuja execução nos preparamos devidamente. A preocupação de fugir aos espanadores e caçarolas tornou-te inapta ao concurso eficiente. Estiveste mais de vinte e cinco anos terrestres, nesta casa, e teimaste em não compreender a laboriosa tarefa da genitora. Não é possível que te habilites a ombrear com ela no trabalho, de um instante para outro. A jovem compreendeu o alcance da observação e chorou amargamente.
Abraçou-a Eliezer, com ternura fraternal, e falou :
– Procura o conforto da prece. Não eras tão amiga de Teresa? Esqueceste-a? Essa grande servidora de Jesus tem a seu cargo numerosas tarefas. Se puder, não te deixará sem a luz do serviço. Cecília ouviu o conselho e orou como nunca havia feito. Lágrimas quentes lavavam-lhe o rosto entristecido. Incoercível força de atração requisitou-a a imenso núcleo de atividade espiritual, região essa, porém, que conseguiu atingir somente após dificuldades e obstáculos oriundos da influenciação de seres inferiores, identificados com as sombras que lhe envolviam o coração. Em lugar de maravilhosos encantos naturais, a ex-religiosa de Espanha recebeu-a generosamente.
Ante as angustiosas comoções que paralisavam a voz da recém-chegada, a servidora do Cristo esclareceu amorável: – Nossas oficinas de trabalho estão hoje grandemente sobrecarregadas de compromissos; mas as tuas preces me tocaram o coração. Conforme vês, Cecília, depois de abandonares a oportunidade de realização divina, que o mundo te oferecia, só encontraste, sem deveres, as criaturas infernais. Onde haja noção do Bem e da Verdade, há imensas tarefas a realizar. Vendo que a jovem soluçava, continuou:
– Estás cansada e abatida, enquanto os que trabalham no bem se envolvem no manto generoso da paz, mesmo nas esferas mais rudes do globo terrestre. Pedes medicamento para teus males e recurso contra tentações; no entanto, para ambos os casos eu somente poderia aconselhar o remédio do trabalho. Não aquele que apenas saiba receitar obrigações para outrem, ou que objetive remunerações e vantagens isoladas; mas o trabalho sentido e vivido dentro de ti mesma. Este é o guia na descoberta de nossas possibilidades divinas, no processo evolutivo do aperfeiçoamento universal. Nele, Cecília, a alma edifica a própria casa, cria valores para a ascensão sublime. Andaste enganada no mundo quando julgavas que o serviço fosse obrigação exclusiva dos homens. Ele é apanágio de todas as criaturas, terrestres e celestes. A verdadeira fé não te poderia ensinar tal fantasia. Sempre te ouvi as orações; no entanto, nunca abriste o espírito às minhas respostas fraternais. Ninguém vive aqui em beatitude descuidosa, quando tantas almas heróicas sofrem e lutam nobremente na Terra. Enquanto a voz da bondosa serva do Evangelho fazia uma pausa, Cecília ajuntou de mãos postas:
– Benfeitora amada, concedei-me lugar entre aqueles que cooperam convosco!... Teresa, sinceramente comovida, esclareceu com bondade:
– Os quadros de meus serviços estão completos, mas tenho uma oportunidade a oferecer-te. Requisitam minha atenção num velho asilo de loucos, na Espanha. Desejas ajudar-me ali? Cecília não cabia em si de gratidão e júbilo. E, naquele mesmo dia, voltava à Terra com obrigações espirituais, convicta de que, auxiliando os desequilibrados, havia de encontrar o próprio equilíbrio.
LIVRO VOLTEI Chico Xavier/Irmão Jacob RETORNO À TAREFA
O trabalho é das maiores bênçãos de Deus no campo das horas. Em suas dádivas de realização para o bem, o triste se reconforta, o ignorante aprende, o doente se refaz, o criminoso se regenera. Agora que alguns raios de luz se faziam sentir dentro de mim, buscava penetrar a grandeza do ato de orar e meditar. Pouco a pouco, perdi o interesse pelas indagações de toda sorte e, quando em palestra com os amigos do meu novo círculo, sabia guardar as conveniências da palavra oportuna. Entendi que receber distinções é acrescentar a responsabilidade individual e, por isso, aprendi a louvar o Supremo Poder sem solicitações particulares em meu benefício. Compreendi que praticar o bem, dando alguma coisa de nós mesmos, nas aquisições de alegria e felicidade para os outros, é o dom sublime por excelência e, em razão disso, preparava-me para ser mais espontâneo e desinteressado no concurso fraterno, mas eficiente e pronto na ação de servir. Longas conversações sem vantagens fundamentais para a vida do espírito perderam o saber com que se me apresentavam, a princípio, quando interpelava Marta e o Irmão Andrade a propósito de mil assuntos diferentes. Suportava; sereno as compridas palestras com entidades sofredoras, necessitadas de desabafo, valendome de tais ocasiões para a ministração de ensinamentos redentores; aos quais se mostrassem inclinadas, mas, sentia-me incapaz de tomar tempo aos companheiros de serviço com interrogações ociosas ou prematuras. Asseverou-me Bezerra, certo dia, que o entendimento da alma é qual lente minúscula no seio da Infinita Obra Universal e que o problema primário da consciência interessada na aquisição de Amor e Sabedoria não é o de perscrutar, com infantilidade ou desespero, os patrimônios da Vida, e, sim, o de enriquecer a lente da própria compreensão, aprimorando-a e dilatando-lhe o poder, a fim de que possa refranger e disseminar a Eterna Grandeza do Senhor, aproveitando-a para si e para os outros. Aceitei, feliz, portanto, o imperativo de recolhimento espiritual e quanto mais buscava entender a pequenez de minha alma e as minhas gigantescas necessidades de auto-renovação, mais reconforto e paz recolhiam da prece que para meu pensamento constituía agora vigoroso manancial de recursos, de cujas forças irradiantes recebia dobrado possibilidades de atacar os novos serviços.
Da Obra ―VOLTEI― – Espírito: IRMÃO JACOB – Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER Digitado por: Lúcia Aydir CONSELHO FRATERNO Irmão Jacob
Sentindo-me incapaz de reiniciar a tarefa, procurei Bezerra para aconselhar-me. O grande orientador recebeu-me com a bondade habitual e explicou, gentil: -Jacob, se os nossos irmãos ignorantes, depois da morte do corpo, na maioria das vezes prosseguem algemados às ações ruinosas a que se dedicaram, continuamos, por nossa vez, nos serviços de espiritualização a que nos devotamos. Sentimo-nos abrasados na sede de conquistar gloriosos cumes, pretendemos adquirir mais luz, mais alegria e vida abundante, de modo a enriquecer a estrada que trilhamos; entretanto, o milagre de nossas antigas concepções terrestres não existe. O Céu é suficientemente iluminado e jubiloso para cogitar os véus de sombra e eliminar os espinhos do sofrimento que decorrem do nosso desacordo com a Lei e conquista-lo, começando semelhante serviço em nossa própria alma. O seu trabalho, pois, é de prosseguimento. Organize um entendimento com os amigos de sua boa luta e retorne aos processos de auxílio. Cada setor de atividade cristã, junto de irmãos obsidiados, doentes, desorientados, ignorantes, criminosos ou infelizes; encarnados ou desencarnados, representa um ângulo da construção de seu próprio paraíso. O espírito vale pelas expressões divinas que pode traduzir no próprio caminho, porque o Criador atende a criatura, através da criatura. Regresse, contente, aos seus casos de socorro. Representam eles a sua melhor oportunidade de servir ao Senhor. Ajudando, libertando e iluminando os outros, você auxiliará, melhorará e engrandecerá a si mesmo. Porque lhe endereçasse algumas palavras com referência ao recomeço, sugeriu me concentrasse atencioso para recordar todos os serviços dos últimos dez anos, de modo a estabelecer um programa criterioso e metódico. Findo o nosso entendimento, isolei-me para a rememoração necessária. Com que imensa clareza lembrava os incidentes! Tive a idéia de que maravilhoso disco de imagens era acionado dentro da minha imaginação, projetando, devagar, sobre a minha retentiva, todos os quadros vividos no último decênio. Anotei quanto me era preciso para a volta ao ministério que encetara, ao abraçar os princípios evangélicos na esfera carnal. Logo após, com a colaboração do irmão Andrade, providenciei um encontro com todos os cooperadores, junto dos quais meus humildes esforços doravante se desdobrariam.
Da Obra ―VOLTEI― – Espírito: IRMÃO JACOB – Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER ANTE OS SERVIÇOS NOVOS Irmão Jacob
A reunião com os amigos fôra confortadora e interessante. Três quartas partes das entidades presentes ligavam-se a mim, através dos trabalhos de doutrinação que efetuara nos círculos terrestres. Remanescentes renovados de antigas agremiações de Espíritos obsessores, ainda incapaz de sintonia com os planos mais elevados, buscavam em mim proteção e arrimo, receando a influência de malfeitores cruéis que os tiranizavam. Guardava comigo a responsabilidade de lhes haver descortinado os horizontes da vida superior, mas eles continuavam necessitando o concurso de alguém que os ajudasse na movimentação dos recursos não muito complexos de que eram detentores, tanto quanto minha situação reclamava companheiros para as obrigações que me cabia desempenhar. Permanecíamos todos na posição dos discípulos de boavontade que, não obstante os devotamentos às lições, não conseguem agir sozinhos. A palavra dos colaboradores expunha-lhes as esperanças no futuro, compelindo-me a refletir nos graves deveres que assumia. Aguardavam a alegria de laborar no próprio aperfeiçoamento. Disputavam forças para a melhora de si mesmos. Traçavam planos de serviços, com entusiasmo confiante. Dirigiam-se a mim, qual se lhe fora um chefe seguro. As noções de responsabilidade penetravam-me o âmago. Não registrava as confidências dos amigos, com o otimismo fácil de outro tempo. Recebia as observações e pareceres; ponderando as dificuldades que sobreviriam. Achava-me realmente confortado, ante a possibilidade de absorver-me na ação edificante; todavia, pesadas reflexões dominavam-me por dentro. Examinamos e discutimos variados casos de obsessões, perseguições e enfermidades, em cuja zona sombria deveríamos penetrar. Recordamos o imperativo de incentivar a cooperação de diversos companheiros, ameaçados pela treva do desânimo e da discórdia, a fim de não imobilizarem a mente e os braços entre os sofredores do mundo. O amigo Andrade, presente à reunião, asseverou sensatamente que é tão difícil modificar as disposições de um Espírito perseguidor e vingativo, quanto reerguer um irmão entregue ao desalento. Nesses minutos de sadia fraternidade, recebi notícias diretas de todos os processos de socorro, nos quais tivera a alegria de funcionar nos últimos anos e, resumindo longas demonstrações verbais, concluímos que era imprescindível atacar o trabalho, semeando o bem. A morte não interrompe o bom combate da luz contra as sombras; intensifica-o, aliás, dilatando o conhecimento divino em derredor do servo operoso e fiel. Constituiríamos, pois, um conjunto de servidores do Evangelho da Redenção, interessados em estende-los, dentro de mais amplo dinamismo espiritual. Estaríamos sediados, ali mesmo, no pequeno burgo onde Marta me aguardara, cheia de carinho e dedicação. Com os recursos intercessores de Bezerra, todos os nossos problemas de localização e movimento de serviço foram solucionados satisfatoriamente.
Da Obra ―VOLTEI― – Espírito: IRMÃO JACOB – Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER ASSEMBLÉIA DE FRATERNIDADE Irmão Jacob
Foi assim que designamos nova data para as bases definitivas da fase diferente de trabalho. No dia marcado, para essa assembléia de fraternidade, as árvores acolhedoras que nos cercavam a moradia mostravam-se também mais formosas e mais serenas, oferecendo flores abertas que pareciam proclamar-nos a esperança nos frutos do porvir. Pássaros alegres cantavam nos ramos, augurando-os sublime alegria... Desde as horas da manhã, grupos de amigos começaram a chegar. Os minutos deslizaram encantadores e de mim não saberia expressar o júbilo que me dominavam as fibras mais íntimas. À noitinha, Bezerra, Sayão, Guillon, Cirne, Inácio Bittencourt, Rosenburg, Frederico Júnior, Ulisses, Tosta, Casimiro Cunha, Batuíra, Romualdo de Seixas, Petintinga, Emmanuel, Ande Luiz e muitos outros trabalhadores do Cristianismo redivivo, no Brasil, permaneciam, conosco, encorajando-nos os corações. Iniciados os trabalhos de comunhão fraternal; diversos orientadores presentes exortaram-nos ao ministério da ação evangélica; e Bezerra de Menezes, conduzindo a parte final, comentou a grandeza da vida que se desdobra, infinita, em todos os ângulos do Universo e a divindade do trabalho edificante que nomeou por escada iluminativa sujos degraus nos conduzem até à Fonte Augusta da Criação. Explanou sabiamente, com referência aos serviços que nos competiriam de ora em diante e reportou-se aos tesouros da boa-vontade, arrancando-nos lágrimas de esperança e contentamento. Por fim, num gesto que provocou alegria geral, convidou André Luiz a fazer a prece de encerramento, aludindo aos seus trabalhos informativo da nossa esfera de ação. O estimado médico da espiritualidade ergueu-se e orou comovidamente: “Senhor Jesus! Dá-nos o poder de operar a própria conversão, Para que o teu Reino de Amor seja irradiado Do centro de nós mesmos!...”“. Contigo em nós, Converteremos A treva em claridade, A dor em alegria, O ódio em amor, A descrença em fé viva, A dúvida em certeza, A maldade em bondade, A ignorância em compreensão e sabedoria, A dureza em ternura, A fraqueza em força, O egoísmo em cântico fraterno. O orgulho em humildade, O torvo mal em infinito bem! Sabemos Senhor, Que de nós mesmos Somente possuímos a inferioridade De que nos devemos desvencilhar... Mas, unidos a Ti, Somos galhos frutíferos Na árvore dos séculos Que as tempestades da experiência jamais deceparão!... Assim, pois, Mestre Amoroso, Digna-te amparar-nos A fim de que nos elevemos Ao encontro de tuas mãos sábias e compassivas, Que nos erguendo da inutilidade Para o serviço da Cooperação Divina, Agora e para sempre, Assim seja!...””.
Da Obra ―VOLTEI― – Espírito: IRMÃO JACOB – Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER RECOMEÇO Irmão Jacob
A oração terminou num deslumbramento de luminosidade e alegria, a estender-se além de nós... Que poderia dizer, em sinal de reconhecimento? De meu júbilo falavam as lágrimas copiosas a me borbulharem dos olhos. Fizeram-se as despedidas e, em breve, enquanto os companheiros de minha nova luta repousavam no domicílio que nos abrigaria o pensamento orientador, vi-me sozinho, sob o arvoredo banhado de luar. Nos céus, brilhavam aquelas mesmas estrelas que, de quando em quando, me habituara a contemplar da Crosta da Terra e, meditando, de alma feliz, sobre o dia seguinte, em que retomaria o mesmo abençoado trabalho que encetara entre os homens, roguei, em silêncio, a bênção do Eterno, para que me não faltassem a luz e a paz, o equilíbrio e a coragem na tarefa bendita do recomeço.
Para que o orgulhoso cesse de crer em sua superioridade, é preciso lhe provar que ele não é mais do que os outros, e que os outros são tanto quanto ele; que a igualdade é um fato e não, simplesmente, uma bela teoria filosófica; verdades que ressaltam da preexistência da alma e da reencarnação. Sem a preexistência da alma, o homem é levado a crer que Deus o beneficiou excepcionalmente, quando crê em Deus; quando não crê, rende graças ao acaso e ao seu próprio mérito.
A preexistência, iniciando-o na vida anterior da alma, lhe ensina a distinguir a vida espiritual infinita, da vida corpórea, temporária; sabe, por aí, que as almas saem iguais das mãos do Criador; que têm um mesmo ponto de partida e um mesmo objetivo, que todas devem alcançar, em mais ou menos tempo segundo os seus esforços; que ele mesmo não chegou ao que é senão depois de ter, por muito tempo e penosamente, vegetado como os outros nos graus inferiores: que não há, entre as mais atrasadas e as mais avançadas, senão uma questão de tempo; que as vantagens de nascimento são puramente corpóreas e independentes do Espírito; que o simples proletário pode, numa outra existência, nascer sobre um trono, e o mais poderoso renascer proletário.
Se não considera senão a vida corpórea, vê as desigualdades sociais do momento; elas o ferem; mas se leva seus olhares sobre o conjunto da vida do Espírito, sobre o passado e sobre o futuro, desde o ponto de partida até o ponto de chegada, essas desigualdades se apagam, e reconhece que Deus não favoreceu a nenhum de seus filhos em prejuízo dos outros; que fez parte igual a cada um e não aplainou o caminho mais para uns do que para outros; que aquele que é menos avançado do que ele sobre a Terra, pode chegar antes dele, se trabalha mais do que ele pelo seu aperfeiçoamento; reconhece, enfim, que cada um não chegando senão pelos seus esforços pessoais, o princípio de igualdade se acha ser, assim, um princípio de justiça e uma lei da Natureza, diante das quais cai o orgulho do privilégio.
A reencarnação,provando que os Espíritos podem renascer em diferentes condições sociais, seja como expiação, seja como prova, ensina que naquele que se trata com desdém, pode-se encontrar um homem que foi nosso superior ou nosso igual numa outra existência, uma amigo ou um parente.
Se o homem o soubesse, tratá-lo-ia com respeito, mas, então, não teria nenhum mérito; e, pelo contrário, se soubesse que seu amigo atual foi seu inimigo, seu servidor ou seu escravo, o repeliria; ora, Deus não quis que isso fosse assim, por isso lançou um véu sobre o passado; desta maneira, o homem é levado a ver, em todos, irmãos e seus iguais; daí uma base natural para a fraternidade; sabendo que ele mesmo poderá ser tratado como houver tratado os outros, a caridade se torna um dever e uma necessidade, fundados sobre a própria Natureza.
Jesus colocou o princípio da caridade, da igualdade e da fraternidade; fez dele uma condição expressa de salvação; mas estava reservado à terceira manifestação da vontade de Deus, ao Espiritismo, pelo conhecimento que dá da vida espiritual, pelos horizontes novos que descobre e as leis que revela, sancionar esse princípio, provando que não é somente uma doutrina moral, mas uma lei da Natureza, e que está no interesse do homem praticá-lo.
Ora, ele o praticará quando, cessando de ver no presente o começo e o fim, compreenderá a solidariedade que existe entre o presente, o passado e o futuro. No campo imenso do infinito que o Espiritismo lhe faz entrever, sua importância pessoal se anula; compreende que sozinho não é nada e nada pode; que todos têm necessidade uns dos outros; duplo revés para o seu orgulho e o seu egoísmo.
Mas, para isso, lhe é necessária a fé, sem a qual ficará forçosamente na rotina do presente; não a fé cega que foge da luz, restringe as idéias, e, por isso mesmo, mantém o egoísmo, mas a fé inteligente, raciocinada, que quer a claridade e não as trevas, que rasga temerariamente o véu dos mistérios e alarga o horizonte; é essa fé, primeiro elemento de todo o progresso, que o Espiritismo lhe traz, fé robusta porque está fundada sobre a experiência e os fatos, porque lhe dá provas palpáveis da imortalidade de sua alma, lhe ensina de onde vem, para onde vai, e porque está sobre a Terra; porque, enfim, ela fixa suas idéias incertas sobre seu passado e sobre seu futuro.
Uma vez entrado largamente nesse caminho, o egoísmo e o orgulho, não tendo mais as mesmas causas de superexcitação, se extinguirão, pouco a pouco, por falta de objetivo e de alimento, e todas as relações sociais se modificarão sob o império da caridade e da fraternidade bem compreendidas.
Isso pode chegar por uma mudança brusca?
Não, isso é impossível: nada é brusco na Natureza; jamais a saúde se torna, subitamente, em uma doença; entre a doença e a saúde há sempre a convalescênça.
O homem não pode, pois, instantaneamente, mudar seu ponto de vista, e levar os seus olhares da Terra ao céu; o infinito o confunde e o ofusca; é-lhe necessário o tempo para assimilar as idéias novas.
O Espiritismo é, sem contradita, o mais poderoso elemento moralizador, porque mina o egoísmo e o orgulho pela base, dando um ponto de apoio à moral: fez milagres de conversões; não são ainda, é verdade, senão cuidados individuais,e freqüentemente parciais; mas o que produziu sobre os indivíduos é a garantia do que produzirá um dia sobre as massas. Ele não pode arrancar as más ervas de repente; dá a fé; a fé é uma boa semente, mas é necessário, a essa semente, o tempo para germinar e dar frutos; eis porque todos os espíritas não são ainda perfeitos.
Ele pegou o homem no meio da vida, no fogo das paixões, na força dos preconceitos, e se, em tais circunstâncias, operou prodígios, que será quando o tomar em seu nascimento, virgem de todas as impressões malsãs; quando aquele receber a caridade desde a meninice, e for embalado pela fraternidade; quando, enfim, toda uma geração será elevada e nutrida nas idéias que a razão aumenta, fortificará em lugar de desunir?
Sob o império dessas idéias, tornadas a fé para todos, o progresso, não encontrando mais obstáculo no egoísmo e no orgulho, as próprias instituições se reformarão e a Humanidade avançará rapidamente para os destinos que lhe foram prometidos sobre a Terra, esperando os do céu. Liberdade, Igualdade, Fraternidade
Liberdade, igualdade, fraternidade, estas três palavras são, por si sós, o programa de toda uma ordem social, que realizaria o progresso mais absoluto da Humanidade, se os princípios que representam pudessem receber sua inteira aplicação.
Vejamos os obstáculos que, no estado atual da sociedade, podem a isso se opor e, ao lado do mal, procuremos o remédio. A fraternidade, na rigorosa acepção da palavra, resume todos os deveres dos homens relativamente uns aos outros; ela significa: devotamento, abnegação, tolerância, benevolência, indulgência; é a caridade evangélica por excelência e a aplicação da máxima: "Agir para com os outros como gostaríamos que os outros agissem conosco."
A contrapartida é o Egoísmo. A fraternidade diz: "Cada um por todos e todos por um." O egoísmo diz: "Cada um por si."
Sendo essas duas qualidades a negação uma da outra, é tão impossível a um egoísta agir fraternalmente, para com os seus semelhantes, quanto o é para um avarento ser generoso, a um homem pequeno alcançar a altura de um homem grande. Ora, sendo o egoísmo a praga dominante da sociedade, enquanto ele reinar dominador, o reino da verdadeira fraternidade será impossível; cada um quererá da fraternidade em seu proveito, mas não a quererá para fazê-la em proveito dos outros; ou, se isso faz, será depois de estar seguro de que não perderá nada.
Considerada do ponto de vista de sua importância para a realização da felicidade social, a fraternidade está em primeira linha: é a base; sem ela não poderia existir nem igualdade e nem liberdade sérias; a igualdade decorre da fraternidade, e a liberdade é a conseqüência das duas outras.
Com efeito, suponhamos uma sociedade de homens bastante desinteressados, bons e benevolentes para viverem, entre si, fraternalmente, não haveria entre eles nem privilégios nem direitos excepcionais, sem o que não haveria ali fraternidade.
Tratar alguém como irmão, é tratá-lo de igual para igual; é querer-lhe o que desejaria para si mesmo; num povo de irmãos, a igualdade será a conseqüência de seus sentimentos, de sua maneira de agir, e se estabelecerá pela força das coisas. Mas qual é o inimigo da igualdade? É o orgulho.
O orgulho que, por toda a parte, quer primar e dominar, que vive de privilégios e de exceções, pode suportar a igualdade social, mas não a fundará jamais e a destruirá na primeira ocasião. Ora, sendo o orgulho, ele também, uma das pragas da sociedade, enquanto não for destruído, oporá uma barreira à verdadeira igualdade.
A liberdade, dissemos, é filha da fraternidade e da igualdade; falamos da liberdade legal e não da liberdade natural que é, por direito, imprescritível para toda criatura humana, desde o selvagem ao homem civilizado. Vivendo os homens como irmãos, com os direitos iguais, animados de um sentimento de benevolência recíproco, praticarão entre si a justiça, não procurarão nunca se fazerem mal, e não terão, conseqüentemente, nada a temer uns dos outros.
A liberdade será sem perigo, porque ninguém pensará em dela abusar em prejuízo de seus semelhantes. Mas como o egoísmo que quer tudo para si, o orgulho que quer sempre dominar, dariam a mão à liberdade que os destronaria?
Os inimigos da liberdade são, pois, ao mesmo tempo, o egoísmo e o orgulho, como o são da igualdade e da fraternidade. A liberdade supõe a confiança mútua; ora, não poderia haver confiança entre pessoas movidas pelo sentimento exclusivo da personalidade; não podendo se satisfazer senão às expensas de outrem, sem cessar, estão em guarda uns contra os outros.
Sempre com medo de perder o que chamam seus direitos, a dominação é a condição mesma de sua existência, por isso armarão sempre ciladas à liberdade, e a abafarão tanto tempo quanto o puderem. Esses três princípios são, pois, como o dissemos, solidários uns com os outros e se servem mutuamente de apoio; sem sua reunião, o edifício social não poderia estar completo. A fraternidade praticada em sua pureza não poderia estar só, porque sem a igualdade e a liberdade não há verdadeira fraternidade.
A liberdade sem a fraternidade dá liberdade de ação a todas as más paixões, que não têm mais freio; com a fraternidade, o homem não faz nenhum mau uso de sua liberdade: é a ordem; sem a fraternidade, ele a usa para dar curso a todas as suas torpezas: é a anarquia, a licença. É por isso que as nações mais livres são forçadas a fazerem restrições à liberdade.
A igualdade sem a fraternidade conduz aos mesmos resultados, porque a igualdade quer a liberdade; sob pretexto de igualdade, o pequeno abate o grande, para se substituir a ele, e se torna tirano a seu turno; isso não é senão um deslocamento do despotismo. Segue-se que, até que os homens estejam imbuídos do sentimento da verdadeira fraternidade, falta tê-los na servidão? Que sejam impróprios às instituições fundadas sobre os princípios de igualdade e de liberdade? Semelhante opinião seria mais do que um erro; seria absurda.
Não se espera que uma criança haja feito todo o seu crescimento para fazê-la caminhar. Quem, aliás, a tem mais freqüentemente em tutela?
São homens de idéias grandes e generosas, guiados pelo amor ao progresso?
Aproveitando da submissão de seus inferiores, para desenvolver neles o senso moral, e elevá-los, pouco a pouco, à condição de homens livres?
Não; são, na maioria, homens ciosos de seu poder, à ambição e à cupidez dos quais outros homens servem de instrumento, mais inteligentes do que animais, e que, para esse efeito, em lugar de emancipá-los os têm, o maior tempo possível, sob o jugo e na ignorância.
Mas essa ordem de coisas muda por si mesma pela força irresistível do progresso. A reação é, às vezes, violenta e tanto mais terrível quanto o sentimento de fraternidade, imprudentemente abafado, não vem interpor um poder moderador; a luta se estabelece, entre aqueles que querem agarrar e aqueles que querem reter; daí um conflito que se prolonga, freqüentemente, durante séculos.
Um equilíbrio factício se estabelece enfim; há melhoria; mas sente-se que as bases sociais não estão sólidas; o solo treme a cada instante sob os passos, porque não é, ainda, o reino da liberdade e da igualdade sob a égide da fraternidade, porque o orgulho e o egoísmo estão sempre ali, levando ao fracasso os esforços dos homens de bem.
Todos vós que sonhais com essa idade de ouro para a Humanidade, trabalhai, antes de tudo, na base do edifício, antes de querer coroar-lhe a cumeeira; dai-lhe por base a fraternidade em sua mais pura acepção; mas, para isso, não basta decretá-la e inscrevê-la sobre uma bandeira; é preciso que ela esteja no coração e não se muda o coração dos homens com decretos.
Do mesmo modo que, para fazer um campo frutificar, é preciso arrancar-lhe as pedras e os espinheiros, trabalhai sem descanso para extirpar o vírus do orgulho e do egoísmo, porque aí está a fonte de todo mal, o obstáculo real ao reino do bem; destruí nas leis, nas instituições, nas religiões, na educação, até os últimos vestígios, os tempos de barbárie e de privilégios, e todas as causas que mantêm e desenvolvem esses eternos obstáculos ao verdadeiro progresso, que se recebe, por assim dizer, desde a meninice e que se aspira por todos os poros na atmosfera social; só então os homens compreenderão os deveres e os benefícios da fraternidade; então, também, se estabelecerão por si mesmos, sem abalos e sem perigo, os princípios complementares da igualdade e da liberdade.
A destruição do egoísmo e do orgulho é possível?
Dizemos alta e ousadamente SIM, de outro modo seria preciso colocar uma suspensão ao progresso da Humanidade.
O homem cresce em inteligência, é um fato incontestável; chegou ao ponto culminante que não poderia ultrapassar?
Quem ousaria sustentar essa tese absurda?
Progride ele em moralidade?
Para responder a esta pergunta, basta comparar as épocas de um mesmo país.
Por que, pois, teria antes alcançado o limite do progresso moral do que do progresso intelectual?
Sua aspiração, para uma ordem de coisas melhor, é um indício da possibilidade de a isso chegar. Aos homens progressistas cabe ativar o movimento pelo estudo e pela prática dos meios mais eficazes.
Estudos Espíritas Capítulo 11 - Trabalho Joanna de Ângelis Conceito
- Genericamente o vocábulo trabalho pode ser definido como: "Ocupação em alguma obra ou ministério; exercício material ou intelectual para fazer ou conseguir alguma coisa. O trabalho, porém, é lei da Natureza mediante a qual o homem forja o próprio progresso desenvolvendo as possibilidades do meio ambiente e um que se situa, ampliando os recursos de preservação da espécie, pela reprodução, o homem vê-se coagido à obediência à lei do trabalho.
O trabalho, no entanto, não se restringe apenas ao esforço de ordem material, física, mas, também, intelectual pelo labor desenvolvido, objetivando as manifestações da Cultura, do Conhecimento, da Arte, da Ciência.
Muito diferente da força aplicada pelo animal, o trabalho no homem objetiva a transformação para melhor das condições e do meio onde se encontra situado, desdobrando a capacidade criativa, de modo a atingir as altas expressões da beleza e da imortalidade, libertando-se, paulatinamente, das formas grosseiras e primárias em que transita para atingir a plenitude da perfeição.
O movimento e o esforço a que são conduzidos os animais e que por generalização passam a ser denominados trabalho, constituem atividade de repetição motivada pelo instinto de "conservação da vida", sem as resultantes realizações criadoras, que facultam o aprimoramento, o progresso, a beleza inerentes ao ser humano. Enquanto os animais agem para prover a subsistência imediata o homem labora criando, desenvolvendo as funções da inteligência que o agigantam, conseguindo meios e recursos novos para aplicação na faina de fazê-lo progredir.
A princípio, o homem, à semelhança do próprio animal, procurava apenas prover as necessidades imediatas, produzindo um fenômeno eminentemente predatório, numa vida nômade, em que se utilizava das reservas animais e vegetais para a caça, a pesca a colheita de frutos silvestres, seguindo adiante, após a destruição das fontes naturais de manutenção. No período da pedra lascada sentiu-se impelido a ampliar os braços e as pernas para atingir as metas da aquisição de recursos, recorrendo a instrumentos rudes, passando mais tarde à agricultura para, da terra, em regime de sociedade, extrair os bens que lhe facultassem a preservação da vida, prosseguindo, imediatamente, a criação de rebanhos que domesticou, capazes de propiciar-lhe relativa abundância, pelo resultante do armazenamento dos excedentes da colheita e do abate animal, deixando de ser precárias as condições, assaz primitivas, em que vivia.
Com a utilização dos instrumentos mais aprimorados para a caça, a pesca, a agricultura, a criação de rebanhos, as atividades tornaram-se rendosas, facultando a troca de mercadorias como primeiro passo para o comércio e posteriormente para a indústria, de modo a fomentar recursos sempre novos e cada vez mais complexos, pelos quais libertava-se paulatinamente das dificuldades iniciais para levantar a base do equilíbrio social, pela previsão e recursos de previdência que sofria com freqüência: secas, guerras, enfermidades. No passado, porém, o trabalho se apresentava para as classes nobres como uma desonra, sendo reservado apenas aos "braços escravos", que se encarregavam de todas as tarefas, de modo a que os dominadores se permitissem a ociosidade brilhante, podendo-se valorizar os recursos dos homens pelo número de escravos e servos de que podiam dispor. Mesmo a cultura da inteligência era transmitida, não raro, por homens ferreteados pela escravidão, e o desenvolvimento das artes, das atividades domésticas encontrava-se em posição subalterna de servilismo desprezado, conquanto indispensável. O trabalho, porém, apresenta-se ao homem como meio de elevação e como expiação de que tem necessidade para resgatar o abuso das forças, quando entregues à ociosidade ou ao crime, na sucessão das existências pelas quais evolute.
Não fora o trabalho e o homem permaneceria na infância primitiva, sendo por Deus muitas vezes facultado ao fraco de forças físicas os inapreciáveis recursos da inteligência, mediante a qual granjeia progresso e respeito, adquirido independência econômica, valor social e consideração, contribuindo poderosamente para o progresso de todos. Com o irrompimento da técnica, que multiplicou os meios para a atividade do homem, na sociedade, veio inevitavelmente a divisão social do próprio trabalho, criando as classes, hoje, como ontem, empenhadas em lutas terrificantes e crescentes. A lei do trabalho, porém, impõe-se a todos e ninguém fugirá dela impunemente, deixando de ser surpreendido mais adiante... A homem algum é permitido usufruir os benefícios do trabalho de outrem sem a justa retribuição e toda exploração imposta pelo usuário representa cárcere e algema para si mesmo, na sucessão das existências inevitáveis a que se encontra impelido a utilizar.
Do trabalho mecânico, rotineiro, primitivo, puro e simples, à automação, houve um progresso gigante que ora permite ao homem o abandono das tarefas rudimentares, entregues a máquinas e instrumentos que ele mesmo aperfeiçoou, concedendo-lhe tempo para a genialidade criativa e a multiplicação em níveis cada vez mais elevados. Sendo o trabalho uma lei natural, o repouso é a conseqüente conquista a que o homem faz jus para refazer as forças e continuar em ritmo de produtividade.
O repouso se lhe impõe como prêmio ao esforço despendido, sendo-lhe facultado o indispensável sustento nos dias da velhice, quando diminuem o poder criativo, as forças e a agilidade na execução das tarefas ligadas à subsistência.
Teorias Econômicas do Trabalho e Justiça Social - Duas são as teorias econômicas do trabalho na estrutura da sociedade: o trabalho-valor que se consusbstancia nas teorias de Adam Smith, JeanBaptiste Say e David Ricardo, que pugnavam pela assertiva de que "o trabalho cria o valor econômico" e a outra, a do trabalho-produção, expressa através dos expoentes da denominada Escola Marginalista, que consideram o trabalho como um dos "fatores da produção, cujo valor é medido pelo valor do produto que cria", considerando-se primacialmente a sua utilidade aplicada ao mercado de consumo. Com a Revolução Industrial e o advento da máquina que modificaram toda a estrutura do trabalho realizado pelo homem, a tese do trabalho-valor sobrepôs-se e foi adotada por Karl Marx, objetivando o trabalhador, nas suas necessidades de reposição do desgaste físico (ou mental), conseqüência direta e imediata da atividade exercida, sendo, assim, o trabalho, inexaurível fonte de todo o progresso humano.
Com o desenvolvimento das Ciências Sociais e o advento das Entidades Previdenciárias e Assistenciais, o homem passou a beneficiar-se de uma regulamentação legal sobre o tempo de trabalho, horário, remuneração extraordinária e a indispensável aposentadoria, observados os requisitos essenciais, assistência médico-odontológica, pensão para a família, quando ocorre o óbito, invalidez remunerada em estrutura de justiça.
As lutas entre patrão e empregado começaram a ser examinadas com maior eqüidade, resolvendo-se em Casas de Justiça os graves problemas a que se viam constrangidos os menos afortunados pelos valores aquisitivos, que, em face da permanente conjuntura econômica a que se vêem a braços os diversos países, eis que com a moeda ganha sempre se adquire menos utilidades, comprimindo-os até o desespero, fomentando a anarquia e o desajustamento comunitário.
Dividido o tempo entre trabalho e lazer, ação e espairecimento, ampliam-se as possibilidades da existência do homem, que, então, frui a decorrência do progresso na saúde, nas manifestações artísticas, na cultura, no prazer, dispondo de tempo para as atividades espirituais, igualmente valiosas, senão indispensáveis para a sua paz interior.
Mediante o trabalho-remunerado o homem modifica o meio, transforma o habitat, cria condições de conforto. Através do trabalho-abnegação, do qual não decorre troca nem permuta de remuneração, ele se modifica a si mesmo, crescendo no sentido moral e espiritual. Por um processo ele se desenvolve na horizontal e se melhora exteriormente; pelo outro, ascende no sentido vertical da vida e se transforma de dentro para fora.
Utilizando-se do primeiro recurso conquista simpatia e respeito, gratidão e amizade. Através da autodoação consegue superar-se, revelando-se instrumento da Misericórdia Divina na construção da felicidade de todos.
Trabalho e Jesus - Fazendo-se carpinteiro e dedicando-se à profissão na elevada companhia de José, o Mestre laborava ativamente, ensinando com o exemplo e respeito ao trabalho, como dever primeiro para a manutenção e preservação da vida, mediante a atividade honrada. Em todo o seu ministério de amor e abnegação tem relevante papel, verdadeiro trabalho de autodoação até sacrifício da própria vida, sem paralelo em toda a História. Seus discípulos, a posteriori, fizeram do trabalho expressão de dignificação, tornando-se "escravos do Senhor" e servos de todos, oferecendo o labor das próprias mãos para a subsistência orgânica, enquanto se "afadigavam" na sementeira da luz. Seu exemplo e Suas lições erguem os escravos que jazem no potro da miséria e dá-lhes suprema coragem no exercício do próprio trabalho através do qual encontram energiar para superar as fracas forças, tornando-se fortes e inatingíveis. Infundem coragem, estimulando o trabalho-serviço fraternal, de modo a manter a comunidade unida em todos os transes. Ensinam esperança, utilizando o trabalho-redenção, por cujo meio o espírito libra acima das próprias limitações e se liberta das malhas da ociosidade e do mal. Agora, quando as luzes do Consolador se acendem na Terra da atualidade, encontrando o homem em pleno labor regulamentado por leis de justiça e previdência, eis que soam no seu espírito as clarinadas do trabalho mantenedor do progresso geral de todos, utilizando-se dos valores da fé para a construção do Mundo Melhor em que o amor dirima as dúvidas, em torno da vida imortal, e a caridade substitua em toda a plenitude a filantropia, à semelhança do que ocorre nos Mundos Felizes onde o trabalho, em vez de ser impositivo, é conquista do homem livre que sabe agir no bem infatigável, servindo sempre e sem cessar. Estudo e meditação: "A necessidade do trabalho é lei da Natureza? " "O trabalho é lei da Natureza, por isso mesmo que constitui uma necessidade, e a civilização obriga o homem a trabalhar mais, porque lhe aumenta as necessidades e os gozos." (O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 674.) "Com efeito, o homem tem por missão trabalhar pela melhoria material do planeta. Cabe-lhe desobstruí-lo, saneá-lo, dispô-lo para receber um dia toda a população que a sua extensão comporta. Para alimentar essa população que cresce incessantemente, preciso se faz aumentar a produção. Se a produção de um país é insuficiente, será necessário buscá-la fora.
Por isso mesmo, as relações entre os povos constituem uma necessidade. A fim de mais as facilitar, cumpre sejam destruídos os obstáculos materiais que os separam e tornadas mais rápidas as comunicações.
Para trabalhos que são obra dos séculos, teve o homem de extrair os materiais até das entranhas da terra; procurou na Ciência os meios de os executar com maior segurança e rapidez. Mas, para os levar a efeito, precisa de recursos: a necessidade fê-lo criar a riqueza, como o fez descobrir a Ciência. A atividade que esses mesmos trabalhos impõem lhe amplia e desenvolve a inteligência, e essa inteligência que se concentra, primeiro, na satisfação das necessidades materiais, o ajudará mais tarde a compreender as grandes verdades morais.
Sendo a riqueza o meio primordial de execução, sem ela não mais grandes trabalhos, nem atividade, nem estimulante, nem pesquisas. Com razão, pois, é a riqueza considerada elemento de progresso." (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec, cap. XVI, item 7.)
Texto extraído do livro Estudos Espíritas, de Divaldo Pereira Franco pelo espírito de Joanna de Ângelis. LIVRO ESTUDANDO O EVANGELHO MARTINS PERALVA Capítulo 3 Renovação Brilhe a vossa luz.
O supremo objetivo do homem, na Terra, é o da sua própria renovação. Aprender, refletir e melhorar-se, pelo trabalho que dignifica
— eis a nossa finalidade, o sentido divino de nossa presença no mundo.
Descendo o Cristo das esferas de luz da Espiritualidade Superior à Terra, teve por escopo orientar a Humanidade na direção do aperfeiçoamento.
―Brilhe a vossa luz‖
— eis a palavra de ordem, enérgica e suave, de Jesus, a quantos Lhe herdaram o patrimônio evangélico, trazido ao mundo ao preço do Seu próprio sacrifício.
A infinita ternura de Sua Angelical Alma sugere-nos, incisiva e amorosamente, o esforço benéfico:
―Brilhe a vossa luz.‖ O interesse do Senhor é o de que os Seus discípulos, de ontem, de hoje e de qualquer tempo, sejam enobrecidos por meio de uma existência moralizada, esclarecida, fraterna.
O Evangelho aí está, como presente dos céus, para que o ser humano se replete com as suas bênçãos, se inunde de suas luzes, se revigore com as suas energias, se enriqueça com os seus ensinos eternos.
O Espiritismo, em particular, como revivescência do Cristianismo, também aí está, ofertando-nos os oceânicos tesouros da Codificação.
Pode-se perguntar: De que mais precisa o homem, para engrandecer-se, pela cultura e pelo sentimento, se lhe não faltam os elementos de renovação, plena, integral, positiva?...
Que falta ao homem moderno, usufrutuário de tantas bênçãos, para que ―brilhe a sua luz?.
A renovação do homem, sob o ponto de vista moral, intelectual e espiritual, é difícil, sem dúvida. Mas é francamente realizável.
É indispensável, tão somente, disponha-se ele ao esforço transformativo, com a consequente utilização desses recursos, desses meios, desses elementos que o Evangelho e o Espiritismo lhe fornecem exuberantemente, farta e abundantemente, sem a exigência de qualquer outro preço a não ser o preço de uma coisa bem simples: a boa vontade.
A disposição de auto-melhoria.
O homem, para renovar-se, tem que estabelecer um programa tríplice, como ponto de partida para a sua realização íntima, para que
―brilhe a sua luz‖, baseado no Estudo, na Meditação e no Trabalho.
ESTUDO: — O estudo se obtém através da leitura do Evangelho, dos livros da Doutrina Espírita e de quaisquer obras educativas, religiosas ou filosóficas, que o levem a projetar a mente na direção dos ideais superiores. O estudo deve ser meditado, assimilado e posto em prática, a fim de que se transforme em frutos de renovação efetiva, positiva e consciente: ―Conhecereis a Verdade e a Verdade vos fará livres.‖
MEDITAÇÃO:
— A meditação é o ato pelo qual se volve o homem para dentro de si mesmo, onde encontrará a Deus, no esplendor de Sua Glória, na plenitude do Seu Poder, na ilimitada expansão do Seu Amor: ―O Reino de Deus está dentro de vós.‖ Através da prece, na meditação, obterá o homem a fé de que necessita para a superação de suas fraquezas e a esperança que lhe estimulará o bom ânimo, na arrancada penosa, bem como o conforto e o bem-estar que lhe assegurarão, nos momentos difíceis, o equilíbrio interior. Na meditação e na prece haurirá o homem a sua própria tonificação, o seu próprio fortalecimento moral e a inspiração para o bem.
TRABALHO:
— O trabalho, em tese, para o ser em processo de evolução, configura-se sob três aspectos principais: material, espiritual, moral. Através do trabalho material, prôpriamente dito, dignifica-se o homem no cumprimento dos deveres para consigo mesmo, para com a família que Deus lhe confiou, para com a sociedade de que participa. Pelo trabalho espiritual, exerce a fraternidade com o próximo e aperfeiçoa-se no conhecimento trancendente da alma imortal. No campo da atividade moral, lutará, simultâneamente, por adquirir qualidades elevadas, ou, se for o caso, por sublimar aquelas com que já se sente aquinhoado. Em resumo: aquisição, cultivo e ampliação de qualidades superiores que o distanciem, em definitivo, da animalidade em que jaz há milênios de milênios:
―É na vossa perseverança que ganhamos as vossas almas.‖ A estrada é difícil, o caminho é longo, repleto de espinhos e pedras, de obstáculos e limitações, porém, a meta é perfeitamente alcançável. Uma coisa, apenas, é indispensável: um pouco de boa vontade. Boa vontade construtiva, eficiente, positiva. O resto virá, no curso da longa viagem...
LIVRO REPORTAGENS DE ALÉM-TÚMULO CHICO XAVIER/HUMBERTO DE CAMPOS CAPÍTULO 20 - O VALOR DO TRABALHO
Ninguém contestava os nobres sentimentos de Cecília Montalvão; entretanto, era de todos sabida sua aversão ao trabalho. No fundo, excelente criatura cheia de conceitos filosóficos, por indicar ao próximo os melhores caminhos. Palestra fácil e encantadora, gestos espontâneos e afetuosos, seduzia quem lhe escutasse o verbo carinhoso. Se a família adotasse outros princípios que não fossem os do Espiritismo cristão, Cecília propenderia talvez à vida conventual. Assim, não ocultava sua admiração pelas moças que, até hoje, de quando em quando se recolhem voluntariamente à sombra do claustro.
Mais por ociosidade que por espírito de adoração a Deus, entrevia nos véus freiráticos o refúgio ideal. No entanto, porque o Espiritismo não lhe possibilitava ensejo de ausentar-se do ambiente doméstico, a pretexto de fé religiosa, cobrava-se em longas conversações sobre os mundos felizes.
Dedicava-se, fervorosa, a toda expressão literária referente às esferas de paz reservadas aos que muito sofreram nos serviços humanos. As mensagens do Além, que descrevessem tais lugares de repouso, eram conservadas com especial dedicação. As descrições dos planetas superiores causavam-lhe arroubos indefiníveis.
Cecília não cuidava de outra coisa que não fosse a antevisão das glórias celestiais. Embalde a velha mãezinha a convocava à lavanderia ou à copa. Nem mesmo nas ocasiões em que o genitor se recolhia ao leito, tomado de tenaz enxaqueca, a jovem abandonava semelhantes atitudes de alheamento às tarefas necessárias. Não raro discutia sobre as festividades magnificentes a que teria direito, após a morte do corpo. Ao seu pensar, o círculo evolutivo que a esperava devia ser imenso jardim de Espíritos redimidos, povoado de perfumes e zéfiros harmoniosos.
No grupo íntimo de preces da família, costumava cooperar certa entidade generosa e evolvida, que se dava a conhecer pelo nome de Eliezer. Cecília interpretava-lhe as advertências de modo puramente individual. Se o amigo exortava ao trabalho, não admitia que a indicação se referisse a serviços na Terra. – Este planeta – dizia enfaticamente – é lugar indigno, escura paragem de almas criminosas e enfermas. Seria irrespirável o ar terrestre se não fora o antegozo dos mundos felizes. Oh! Como deve ser sublimes vida em Júpiter, a beleza dos dias em Saturno, seguidos de noites iluminadas de anéis resplandecentes! O pântano terrestre envenena as almas bem formadas e não poderemos fugir à repugnância e ao tédio doloroso!...
– Mais, minha filha – objetava a genitora complacente –, não devemos adotar opiniões tão extremistas. Não é o planeta inútil e mau assim. Não será justo interpretar nossa existência terrena como fase de preparação educativa? Sempre notei que qualquer trabalho, desde que honesto, é título de glória para a criatura...
Todavia, antes que a velha completasse os conceitos, voltava a filha intempestivamente, olvidando carinhosas observações de Eliezer:
– Nada disso! A senhora, mamãe, cristalizada como se encontra, entre pratos e caçarolas, não me poderá compreender. Suas observações resultam da rotina cruel, que se esforça por não quebrar. Este mundo é cárcere sombrio, onde tudo é miséria angustiosa e creio mesmo que o maior esforço, por extinguir sofrimentos, seria igual ao de alguém que desejasse apagar um vulcão com algumas gotas dágua.
Tudo inútil. Estou convencida de que a Terra foi criada para 79 triste destinação. Só a morte física pode restituir-nos a liberdade. Transportar-nos-emos a esferas ditosas, conheceremos paraísos iluminados e sem-fim. A senhora Montalvão contemplava a filha, lamentando-lhe a atitude mental, e, esganando os móveis, por não perder tempo, respondia tranquila, encerrando a conversa: – Prefiro crer, minha filha, que tanto a vela de sebo, como a estrela luminosa, representam dádivas de Deus às criaturas.
E, se não sabemos valorizar ainda a vela pequenina que está neste mundo, como nos atreveremos a invadir a grandeza dos astros? E antes que a moça voltasse a considerações novas, a bondosa genitora corria à cozinha, a cuidar do jantar.
Qualquer tentativa, tendente a esclarecer a jovem, redundava infrutífera. Solicitações enérgicas dos pais, pareceres criteriosos dos amigos, advertências do plano espiritual, eram relegados a completo esquecimento. Fervorosa admiradora da vida e obras de Teresa de Jesus, a notável religiosa da Espanha do século XVI, Cecília endereçava-lhe ardentes rogativas, idealizando a missionária do Carmelo num jardim de delicias, diariamente visitada por Jesus e seus anjos. Não queria saber se a grande mística trabalhava, ignorava-lhe as privações e sofrimentos, para só recordá-la em genuflexão ao pé dos altares. Acentuando-se-lhe a preguiça mental, vivia segregada, longe de tudo e de todos. Essa atitude influía vigorosamente no seu físico, e muito antes de trinta anos Cecília regressava ao plano espiritual, absolutamente envolvida na atmosfera de ilusões. Por isso mesmo, dolorosas lhe foram as surpresas da vida real. Despertou além-túmulo, sem lobrigar vivalma. Depois de longos dias solitários e tristes, a caminhar sem destino, encontrou uma Colônia espiritual, onde, no entanto, não havia criaturas em ociosidade. Todos trabalhavam afanosamente. Pediu, receosa, admissão à presença do respectivo diretor. Recebeu-a generoso ancião, em espaçoso recinto.
Observando-lhe, porém, as lânguidas atitudes, o velhinho amorável sentenciou:
– Minha filha, não posso hoje dispor de muito tempo ao seu lado, pelo que espero manifeste seus propósitos sem delongas. Estupefata ante o que ouvia, ela expôs suas mágoas e desilusões, com lágrimas amargurosas. Supunha que após a morte do corpo não houvesse trabalho. Estava confundida em angustioso abatimento.
Sorriu o ancião benévolo e acrescentou:
– Essas fantasias são neblinas no céu dos pensamentos. Esqueça-as, bondosa menina. Não se gaste em referências pessoais. E entremostrando preocupação de serviço, concluía:
– Por não termos descanso para hoje, gostaria dissesse em que lhe posso ser útil. Desapontada, lembrou a jovem a bondade de Eliezer e explicou o desejo de encontrá-lo. O velhinho pensou alguns momentos e esclareceu:
– Não disponho de auxiliares que possam ajudá-la, mas posso orientá-la quanto à direção que precisa tomar. Colocada a caminho, Cecília Montalvão viu-se perseguida de elementos inferiores; figuras repugnantes apresentavam-se-lhe na estrada, perguntando pelas regiões de repouso. Depois de emoções amargas, chegou à antiga residência, onde os familiares não lhe perceberam a nova forma. Ia retirar-se em pranto, quando viu alguém sair da cozinha num halo de luz.
Era o generoso Eliezer que a ela se dirigia com sorriso afetuoso. Cecília caiu-lhe nos braços fraternais e queixou-se, lacrimosa :
– Ah! meu venerando amigo, estou abandonada de todos. Compadecei-vos de mim!... Guiai-me, por caridade, aos caminhos da paz!...
– Acalma-te – murmurou o benfeitor plácido e gentil
–, hoje estou bastante ocupado; entretanto, aconselho-te a orar fervorosamente, renovando resoluções. – Ocupado?
– bradou a jovem, desesperada
– não sois instrutor na revelação espiritual?
– Sim, sim, de dias a dias coopero no serviço das verdades divinas, mas tenho outras responsabilidades a atender.
– E que tereis no dia de hoje, em caráter tão imperativo, abandonando-me também à maneira dos outros?
– interrogou a recém-desencarnada revelando funda revolta.
– Devo auxiliar tua mãezinha nos encargos domésticos
– ajuntou Eliezer brandamente
–, logo mais tenho serviço junto a irmãos nossos. Não te recordas do tintureiro da esquina próxima? Preciso contribuir no tratamento da filha, que se feriu no trabalho, ontem à noite, por excesso de fadiga no ganha-pão.
Lembras-te do nosso Natércio, o pedreiro?
O pobrezinho caiu hoje de grande altura, machucou-se bastante e aguarda-me no hospital. A interlocutora estava envergonhada. Somente agora se reconhecia vítima de si mesma.
– Não poderíeis localizar-me aqui, auxiliando a mamãe?
– perguntou suplicante.
– É impossível, por enquanto
– esclareceu o amigo solícito
–, só podemos cooperar com êxito no trabalho para cuja execução nos preparamos devidamente. A preocupação de fugir aos espanadores e caçarolas tornou-te inapta ao concurso eficiente. Estiveste mais de vinte e cinco anos terrestres, nesta casa, e teimaste em não compreender a laboriosa tarefa da genitora. Não é possível que te habilites a ombrear com ela no trabalho, de um instante para outro. A jovem compreendeu o alcance da observação e chorou amargamente.
Abraçou-a Eliezer, com ternura fraternal, e falou :
– Procura o conforto da prece. Não eras tão amiga de Teresa? Esqueceste-a? Essa grande servidora de Jesus tem a seu cargo numerosas tarefas. Se puder, não te deixará sem a luz do serviço. Cecília ouviu o conselho e orou como nunca havia feito. Lágrimas quentes lavavam-lhe o rosto entristecido. Incoercível força de atração requisitou-a a imenso núcleo de atividade espiritual, região essa, porém, que conseguiu atingir somente após dificuldades e obstáculos oriundos da influenciação de seres inferiores, identificados com as sombras que lhe envolviam o coração. Em lugar de maravilhosos encantos naturais, a ex-religiosa de Espanha recebeu-a generosamente.
Ante as angustiosas comoções que paralisavam a voz da recém-chegada, a servidora do Cristo esclareceu amorável: – Nossas oficinas de trabalho estão hoje grandemente sobrecarregadas de compromissos; mas as tuas preces me tocaram o coração. Conforme vês, Cecília, depois de abandonares a oportunidade de realização divina, que o mundo te oferecia, só encontraste, sem deveres, as criaturas infernais. Onde haja noção do Bem e da Verdade, há imensas tarefas a realizar. Vendo que a jovem soluçava, continuou:
– Estás cansada e abatida, enquanto os que trabalham no bem se envolvem no manto generoso da paz, mesmo nas esferas mais rudes do globo terrestre. Pedes medicamento para teus males e recurso contra tentações; no entanto, para ambos os casos eu somente poderia aconselhar o remédio do trabalho. Não aquele que apenas saiba receitar obrigações para outrem, ou que objetive remunerações e vantagens isoladas; mas o trabalho sentido e vivido dentro de ti mesma. Este é o guia na descoberta de nossas possibilidades divinas, no processo evolutivo do aperfeiçoamento universal. Nele, Cecília, a alma edifica a própria casa, cria valores para a ascensão sublime. Andaste enganada no mundo quando julgavas que o serviço fosse obrigação exclusiva dos homens. Ele é apanágio de todas as criaturas, terrestres e celestes. A verdadeira fé não te poderia ensinar tal fantasia. Sempre te ouvi as orações; no entanto, nunca abriste o espírito às minhas respostas fraternais. Ninguém vive aqui em beatitude descuidosa, quando tantas almas heróicas sofrem e lutam nobremente na Terra. Enquanto a voz da bondosa serva do Evangelho fazia uma pausa, Cecília ajuntou de mãos postas:
– Benfeitora amada, concedei-me lugar entre aqueles que cooperam convosco!... Teresa, sinceramente comovida, esclareceu com bondade:
– Os quadros de meus serviços estão completos, mas tenho uma oportunidade a oferecer-te. Requisitam minha atenção num velho asilo de loucos, na Espanha. Desejas ajudar-me ali? Cecília não cabia em si de gratidão e júbilo. E, naquele mesmo dia, voltava à Terra com obrigações espirituais, convicta de que, auxiliando os desequilibrados, havia de encontrar o próprio equilíbrio.
LIVRO VOLTEI Chico Xavier/Irmão Jacob RETORNO À TAREFA
O trabalho é das maiores bênçãos de Deus no campo das horas. Em suas dádivas de realização para o bem, o triste se reconforta, o ignorante aprende, o doente se refaz, o criminoso se regenera. Agora que alguns raios de luz se faziam sentir dentro de mim, buscava penetrar a grandeza do ato de orar e meditar. Pouco a pouco, perdi o interesse pelas indagações de toda sorte e, quando em palestra com os amigos do meu novo círculo, sabia guardar as conveniências da palavra oportuna. Entendi que receber distinções é acrescentar a responsabilidade individual e, por isso, aprendi a louvar o Supremo Poder sem solicitações particulares em meu benefício. Compreendi que praticar o bem, dando alguma coisa de nós mesmos, nas aquisições de alegria e felicidade para os outros, é o dom sublime por excelência e, em razão disso, preparava-me para ser mais espontâneo e desinteressado no concurso fraterno, mas eficiente e pronto na ação de servir. Longas conversações sem vantagens fundamentais para a vida do espírito perderam o saber com que se me apresentavam, a princípio, quando interpelava Marta e o Irmão Andrade a propósito de mil assuntos diferentes. Suportava; sereno as compridas palestras com entidades sofredoras, necessitadas de desabafo, valendome de tais ocasiões para a ministração de ensinamentos redentores; aos quais se mostrassem inclinadas, mas, sentia-me incapaz de tomar tempo aos companheiros de serviço com interrogações ociosas ou prematuras. Asseverou-me Bezerra, certo dia, que o entendimento da alma é qual lente minúscula no seio da Infinita Obra Universal e que o problema primário da consciência interessada na aquisição de Amor e Sabedoria não é o de perscrutar, com infantilidade ou desespero, os patrimônios da Vida, e, sim, o de enriquecer a lente da própria compreensão, aprimorando-a e dilatando-lhe o poder, a fim de que possa refranger e disseminar a Eterna Grandeza do Senhor, aproveitando-a para si e para os outros. Aceitei, feliz, portanto, o imperativo de recolhimento espiritual e quanto mais buscava entender a pequenez de minha alma e as minhas gigantescas necessidades de auto-renovação, mais reconforto e paz recolhiam da prece que para meu pensamento constituía agora vigoroso manancial de recursos, de cujas forças irradiantes recebia dobrado possibilidades de atacar os novos serviços.
Da Obra ―VOLTEI― – Espírito: IRMÃO JACOB – Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER Digitado por: Lúcia Aydir CONSELHO FRATERNO Irmão Jacob
Sentindo-me incapaz de reiniciar a tarefa, procurei Bezerra para aconselhar-me. O grande orientador recebeu-me com a bondade habitual e explicou, gentil: -Jacob, se os nossos irmãos ignorantes, depois da morte do corpo, na maioria das vezes prosseguem algemados às ações ruinosas a que se dedicaram, continuamos, por nossa vez, nos serviços de espiritualização a que nos devotamos. Sentimo-nos abrasados na sede de conquistar gloriosos cumes, pretendemos adquirir mais luz, mais alegria e vida abundante, de modo a enriquecer a estrada que trilhamos; entretanto, o milagre de nossas antigas concepções terrestres não existe. O Céu é suficientemente iluminado e jubiloso para cogitar os véus de sombra e eliminar os espinhos do sofrimento que decorrem do nosso desacordo com a Lei e conquista-lo, começando semelhante serviço em nossa própria alma. O seu trabalho, pois, é de prosseguimento. Organize um entendimento com os amigos de sua boa luta e retorne aos processos de auxílio. Cada setor de atividade cristã, junto de irmãos obsidiados, doentes, desorientados, ignorantes, criminosos ou infelizes; encarnados ou desencarnados, representa um ângulo da construção de seu próprio paraíso. O espírito vale pelas expressões divinas que pode traduzir no próprio caminho, porque o Criador atende a criatura, através da criatura. Regresse, contente, aos seus casos de socorro. Representam eles a sua melhor oportunidade de servir ao Senhor. Ajudando, libertando e iluminando os outros, você auxiliará, melhorará e engrandecerá a si mesmo. Porque lhe endereçasse algumas palavras com referência ao recomeço, sugeriu me concentrasse atencioso para recordar todos os serviços dos últimos dez anos, de modo a estabelecer um programa criterioso e metódico. Findo o nosso entendimento, isolei-me para a rememoração necessária. Com que imensa clareza lembrava os incidentes! Tive a idéia de que maravilhoso disco de imagens era acionado dentro da minha imaginação, projetando, devagar, sobre a minha retentiva, todos os quadros vividos no último decênio. Anotei quanto me era preciso para a volta ao ministério que encetara, ao abraçar os princípios evangélicos na esfera carnal. Logo após, com a colaboração do irmão Andrade, providenciei um encontro com todos os cooperadores, junto dos quais meus humildes esforços doravante se desdobrariam.
Da Obra ―VOLTEI― – Espírito: IRMÃO JACOB – Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER ANTE OS SERVIÇOS NOVOS Irmão Jacob
A reunião com os amigos fôra confortadora e interessante. Três quartas partes das entidades presentes ligavam-se a mim, através dos trabalhos de doutrinação que efetuara nos círculos terrestres. Remanescentes renovados de antigas agremiações de Espíritos obsessores, ainda incapaz de sintonia com os planos mais elevados, buscavam em mim proteção e arrimo, receando a influência de malfeitores cruéis que os tiranizavam. Guardava comigo a responsabilidade de lhes haver descortinado os horizontes da vida superior, mas eles continuavam necessitando o concurso de alguém que os ajudasse na movimentação dos recursos não muito complexos de que eram detentores, tanto quanto minha situação reclamava companheiros para as obrigações que me cabia desempenhar. Permanecíamos todos na posição dos discípulos de boavontade que, não obstante os devotamentos às lições, não conseguem agir sozinhos. A palavra dos colaboradores expunha-lhes as esperanças no futuro, compelindo-me a refletir nos graves deveres que assumia. Aguardavam a alegria de laborar no próprio aperfeiçoamento. Disputavam forças para a melhora de si mesmos. Traçavam planos de serviços, com entusiasmo confiante. Dirigiam-se a mim, qual se lhe fora um chefe seguro. As noções de responsabilidade penetravam-me o âmago. Não registrava as confidências dos amigos, com o otimismo fácil de outro tempo. Recebia as observações e pareceres; ponderando as dificuldades que sobreviriam. Achava-me realmente confortado, ante a possibilidade de absorver-me na ação edificante; todavia, pesadas reflexões dominavam-me por dentro. Examinamos e discutimos variados casos de obsessões, perseguições e enfermidades, em cuja zona sombria deveríamos penetrar. Recordamos o imperativo de incentivar a cooperação de diversos companheiros, ameaçados pela treva do desânimo e da discórdia, a fim de não imobilizarem a mente e os braços entre os sofredores do mundo. O amigo Andrade, presente à reunião, asseverou sensatamente que é tão difícil modificar as disposições de um Espírito perseguidor e vingativo, quanto reerguer um irmão entregue ao desalento. Nesses minutos de sadia fraternidade, recebi notícias diretas de todos os processos de socorro, nos quais tivera a alegria de funcionar nos últimos anos e, resumindo longas demonstrações verbais, concluímos que era imprescindível atacar o trabalho, semeando o bem. A morte não interrompe o bom combate da luz contra as sombras; intensifica-o, aliás, dilatando o conhecimento divino em derredor do servo operoso e fiel. Constituiríamos, pois, um conjunto de servidores do Evangelho da Redenção, interessados em estende-los, dentro de mais amplo dinamismo espiritual. Estaríamos sediados, ali mesmo, no pequeno burgo onde Marta me aguardara, cheia de carinho e dedicação. Com os recursos intercessores de Bezerra, todos os nossos problemas de localização e movimento de serviço foram solucionados satisfatoriamente.
Da Obra ―VOLTEI― – Espírito: IRMÃO JACOB – Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER ASSEMBLÉIA DE FRATERNIDADE Irmão Jacob
Foi assim que designamos nova data para as bases definitivas da fase diferente de trabalho. No dia marcado, para essa assembléia de fraternidade, as árvores acolhedoras que nos cercavam a moradia mostravam-se também mais formosas e mais serenas, oferecendo flores abertas que pareciam proclamar-nos a esperança nos frutos do porvir. Pássaros alegres cantavam nos ramos, augurando-os sublime alegria... Desde as horas da manhã, grupos de amigos começaram a chegar. Os minutos deslizaram encantadores e de mim não saberia expressar o júbilo que me dominavam as fibras mais íntimas. À noitinha, Bezerra, Sayão, Guillon, Cirne, Inácio Bittencourt, Rosenburg, Frederico Júnior, Ulisses, Tosta, Casimiro Cunha, Batuíra, Romualdo de Seixas, Petintinga, Emmanuel, Ande Luiz e muitos outros trabalhadores do Cristianismo redivivo, no Brasil, permaneciam, conosco, encorajando-nos os corações. Iniciados os trabalhos de comunhão fraternal; diversos orientadores presentes exortaram-nos ao ministério da ação evangélica; e Bezerra de Menezes, conduzindo a parte final, comentou a grandeza da vida que se desdobra, infinita, em todos os ângulos do Universo e a divindade do trabalho edificante que nomeou por escada iluminativa sujos degraus nos conduzem até à Fonte Augusta da Criação. Explanou sabiamente, com referência aos serviços que nos competiriam de ora em diante e reportou-se aos tesouros da boa-vontade, arrancando-nos lágrimas de esperança e contentamento. Por fim, num gesto que provocou alegria geral, convidou André Luiz a fazer a prece de encerramento, aludindo aos seus trabalhos informativo da nossa esfera de ação. O estimado médico da espiritualidade ergueu-se e orou comovidamente: “Senhor Jesus! Dá-nos o poder de operar a própria conversão, Para que o teu Reino de Amor seja irradiado Do centro de nós mesmos!...”“. Contigo em nós, Converteremos A treva em claridade, A dor em alegria, O ódio em amor, A descrença em fé viva, A dúvida em certeza, A maldade em bondade, A ignorância em compreensão e sabedoria, A dureza em ternura, A fraqueza em força, O egoísmo em cântico fraterno. O orgulho em humildade, O torvo mal em infinito bem! Sabemos Senhor, Que de nós mesmos Somente possuímos a inferioridade De que nos devemos desvencilhar... Mas, unidos a Ti, Somos galhos frutíferos Na árvore dos séculos Que as tempestades da experiência jamais deceparão!... Assim, pois, Mestre Amoroso, Digna-te amparar-nos A fim de que nos elevemos Ao encontro de tuas mãos sábias e compassivas, Que nos erguendo da inutilidade Para o serviço da Cooperação Divina, Agora e para sempre, Assim seja!...””.
Da Obra ―VOLTEI― – Espírito: IRMÃO JACOB – Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER RECOMEÇO Irmão Jacob
A oração terminou num deslumbramento de luminosidade e alegria, a estender-se além de nós... Que poderia dizer, em sinal de reconhecimento? De meu júbilo falavam as lágrimas copiosas a me borbulharem dos olhos. Fizeram-se as despedidas e, em breve, enquanto os companheiros de minha nova luta repousavam no domicílio que nos abrigaria o pensamento orientador, vi-me sozinho, sob o arvoredo banhado de luar. Nos céus, brilhavam aquelas mesmas estrelas que, de quando em quando, me habituara a contemplar da Crosta da Terra e, meditando, de alma feliz, sobre o dia seguinte, em que retomaria o mesmo abençoado trabalho que encetara entre os homens, roguei, em silêncio, a bênção do Eterno, para que me não faltassem a luz e a paz, o equilíbrio e a coragem na tarefa bendita do recomeço.